Título: Lula promete a aliados pastas com 'porteira fechada' no 2º mandato
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/06/2006, Nacional, p. A4

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está prometendo "porteira fechada" nos ministérios aos partidos que apoiarem sua candidatura à reeleição. O termo, no jargão político, significa delegar ao aliado a tarefa de preencher todos os cargos da estrutura ministerial e das estatais, de cima a baixo. Lula garante que o PT - hoje ocupando 16 das 33 pastas e secretarias especiais - perderá espaço numa nova administração e cederá vagas aos outros partidos, principalmente ao PMDB.

Em conversas na semana passada, Lula prometeu um governo de inclusão partidária. Empenhado em não deixar brechas para mais uma crise interminável, acenou com o atendimento das reivindicações dos aliados, que sempre reclamaram da interferência do PT na máquina administrativa. Lula não citou a expressão "porteira fechada" pelo grau de fisiologismo que carrega: em seu lugar, adotou o mantra do "governo de coalizão", inspirado no modelo parlamentarista.

Confiante num segundo mandato, o presidente disse aos interlocutores do PMDB, PSB e PC do B que daqui para frente tudo será diferente na relação com seus parceiros. Na tentativa de sinalizar nessa direção, ele começará desde já a atender ao PMDB, que apresentou fatura antecipada, com um pacote de pedidos para postos-chave.

O PMDB quer retomar, por exemplo, o controle do Ministério da Saúde, está de olho na presidência da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), cobiça diretorias da Eletrobrás, da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), de Furnas e da Petrobrás, além de vários cargos nos Correios.

Se reeleito, Lula deseja que o PMDB seja o parceiro preferencial do governo, para não ser obrigado a recorrer às pequenas legendas com um esquema de toma-lá-dá-cá, sistema que foi o pivô do escândalo do mensalão. A promessa palaciana que serve como isca para soldar o dividido PMDB é a da inclusão de todas as alas no Executivo. O Planalto e o PT negam que a prática represente o loteamento da Esplanada.

"Não se monta governo por retalhos nem se deixa ambigüidades nas responsabilidades", afirma o ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro. Coordenador político há três meses, Tarso alega que o almejado governo de coalizão deve ser construído em torno de "propostas programáticas", com metas para um crescimento mais acelerado.

"Mas se os partidos não assumem (cargos), não têm como enquadrar sua base no Congresso e o governo não tem estabilidade para trabalhar", diz ele. Na sua avaliação, esse novo padrão de relacionamento - prometido na campanha de 2002, mas nunca implantado - trará uma "diferença radical" ao mundo político. "A crise, quando houver, será do partido e do ministro, e não do presidente e do governo", filosofa Tarso.

CARGUINHOS

Mesmo não integrando a ala governista do PMDB, o presidente do partido, deputado Michel Temer (SP), aplaude a idéia. "É uma coisa civilizada, de modelo parlamentarista. Não se trata de entregar uns carguinhos. O vencedor da disputa entrega setores do governo para um determinado partido, que tem a prerrogativa de fazer as indicações. É uma coalizão de forças."

Diplomático, o presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), não mostra resistência à proposta, embora Lula diga que os petistas perderão posições num eventual segundo mandato. "O PT tem interesses políticos, mas não vive disso", afirma. Para Berzoini, o novo modelo não tem inspiração fisiológica. "Ao contrário: a idéia é definir com transparência quem está em determinado cargo, por que está e o partido em questão terá de prestar contas do que está fazendo."

Até agora, no entanto, tudo é retórica. Nem o esboço do programa coletivo de governo - com sugestões dos tradicionais aliados, como PC do B e PSB - saiu do papel. Está de molho, ainda, o manifesto que seria assinado pela frente de apoio à reeleição, destacando a importância do setor produtivo num novo mandato de Lula.

O motivo do atraso é que tanto o PC do B como o PSB ameaçam não integrar oficialmente a coligação por causa de divergências nos Estados com o PT e da cláusula de barreira, que obriga todo partido a obter pelo menos 5% dos votos no País e 2% em nove Estados para ter direito aos repasses do Fundo Partidário e aos programas gratuitos de rádio e TV.

"Não dá para resolver todos os problemas ao mesmo tempo", justifica o presidente do PSB, deputado Eduardo Campos (PE). "Cada partido fará o seu documento sobre o que espera de um segundo mandato de Lula e dará um tempo para que o comando da campanha analise e diga como podemos colaborar, mesmo se não estivermos formalmente na coligação." Aborrecido com o PT, que não quer apoiar os poucos candidatos comunistas com viabilidade eleitoral, o presidente do PC do B, Renato Rabelo, afirma que a proposta de coalizão é muito boa, se for para valer. "Não se pode firmar aliança sem compromissos e responsabilidades definidos", insiste Rabelo. "Se não for assim, o governo acaba caindo na terrível situação de fazer acordo no varejo", completa, insinuando que o fim dessa história é amplamente conhecido.