Título: América do Sul vive onda populista clássica
Autor: Paulo Moreira Leite
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/06/2006, Nacional, p. A9

Criado pela ciência política norte-americana, o termo "populista" nasceu sem conotações pejorativas, para designar políticos que buscavam apoiar-se nas massas populares para pressionar as instituições. O patrono internacional da categoria é o ex-presidente americano Andrew Jackson, que mobilizava os pobres e negros do Sul contra a aristocracia branca que governava os EUA desde a independência.

Na semana passada, ao falar de suas vantagens em relação aos adversários políticos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu a si mesmo uma definição clássica de populismo: "Tenho uma coisa especial: minha relação direta com o povo brasileiro."

Há diferenças enormes no tom, nos gestos e nas ambições, mas no Brasil e na Argentina, na Bolívia e na Venezuela, vive-se um quadro político populista clássico: eleitos pelo voto direto, governos ligados às camadas humildes da população mantém convivência tensa com as instituições e apóiam-se nas massas para manter projetos de poder.

Para muitos observadores, o movimento eleitoral que ocorre hoje no Continente é mais profundo do que se imagina. De certa forma, é como se o sujeito tivesse trocado de lugar com o objeto. Não são os políticos tradicionais, de qualquer família ideológica, que usam a população humilde para conseguir votos e prestígio, em troca de migalhas eleitorais. É o povo humilde que descobriu que pode usar o voto em benefício próprio, arrancando vantagens como programas sociais com auxílio direto.

Para o embaixador Rubens Ricupero, diretor da Fundação Armando Álvares Penteado, a "onda populista é o preço que a América do Sul paga para integrar as massas excluídas que têm voto direto". Ele lembra que a Europa viveu um processo semelhante no século 19, quando as massas operárias foram incorporadas à economia dos países capitalistas centrais.