Título: Senado muda benefício a hediondo
Autor: Lígia Formenti
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/05/2006, Metrópole, p. C1

Projeto aprovado por comissão prevê que condenado só tenha direito a semi-aberto após cumprir 50% da pena

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado aprovou ontem projeto de lei do senador Demóstenes Torres (PFL-GO) que estabelece novas regras para a chamada progressão da pena no caso de réus condenados por crime hediondo. A proposta, que agora segue para a Câmara, prevê que condenados por esse tipo de crime que não sejam reincidentes só passem do regime fechado ao semi-aberto depois de cumprir metade da pena.

A proposta é mais severa do que a apresentada pelo governo e que aguarda avaliação na Câmara. Pela sugestão do governo, a concessão do benefício seria dada mais rapidamente: o regime mais brando seria após cumprir um terço da pena.

Pelo projeto aprovado, um réu condenado a 30 anos só vai para o semi-aberto depois de 15. No projeto do governo, o benefício viria depois de 10 anos.

Justamente por discordar da proposta de Torres, o governo tentou ontem propor algumas emendas para tornar mais brando o projeto. Mas sem sucesso. Por 11 votos a 3, ficou valendo o texto original.

O projeto do senador teve uma tramitação meteórica, comparado com o desempenho de outros projetos. Ele foi apresentado em março, semanas depois da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que considerou inconstitucional a parte da Lei dos Crimes Hediondos, que vedava aos condenados o direito à progressão da pena - ir do regime fechado até o aberto.

Com a decisão do STF, passaram a valer as regras gerais de progressão da pena para condenados: os primeiros benefícios começariam a valer depois de o réu cumprir um sexto da pena em regime fechado. Para a corrente mais conservadora, um tempo muito pequeno. Justamente por isso, o senador ingressou com o projeto, prevendo regras específicas para os condenados. Até a decisão final do Congresso e a sanção presidencial, no entanto, valem as regras gerais.

O texto do senador agora será apreciado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. O projeto do governo será apensado ao do senador. "Se houver mudança de rumo e a Câmara preferir a proposta mais branda do governo, o texto volta para o Senado", diz. Caso contrário, ele segue para o plenário. "Em um mês, se tudo der certo, ele vai à sanção."

Torres diz estar otimista quanto aos rumos do projeto. "Há boa receptividade. Poucos são os que pactuam com a tese do governo, que acha que o melhor é soltar logo os presos." Só em São Paulo há 51 mil presos por crimes hediondos.

Pela proposta de Torres, criminosos reincidentes têm de se submeter a uma regra mais rígida para a progressão da pena. Eles somente passariam para regime semi-aberto depois de cumprir dois terços da pena em regime fechado.

Hoje existem 10 tipos de crimes hediondos, entre eles o homicídio qualificado. É esta acusação que pesa contra o jornalista Antônio Marcos Pimenta Neves. O que qualifica um homicídio são algumas circunstâncias definidas em lei. No caso de Pimenta, a promotoria diz que ele agiu por motivo torpe e sem dar chance de defesa à vítima.

A aprovação da proposta no Senado dividiu especialistas. Para o procurador-geral de Justiça, Rodrigo César Rebello Pinho, a iniciativa é boa. "Fala no regime inicial fechado, estabelece progressão a partir da metade da pena para os primários e lembra, neste caso, de diferenciar os reincidentes."

O presidente da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, Luiz Flávio Borges D'Urso, concorda com Pinho. "A lei é bem-vinda. Garantiremos, caso o projeto seja sancionado, a possibilidade de progressão de regime para o semi-aberto, coisa que a lei anterior dizia ser inconstitucional."

Para criminalista Luiz Flávio Gomes, a exigência do cumprimento de metade da pena para réus primários é um exagero. "O percentual só se justifica para crimes hediondos violentos(como latrocínio e estupro)." Para ele, o correto seria determinar o direito à progressão de regime a partir de um sexto da pena para o preso comum, de um terço para crimes hediondos não-violentos (como tráfico de drogas ou remédios) e metade da pena apenas para casos hediondos violentos.