Título: Terrorista do 11/9 pega perpétua
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Fonte: O Estado de São Paulo, 04/05/2006, Internacional, p. A14

'América, você perdeu, eu venci', gritou, após o veredicto, o único condenado pelos atentados de 2001 nos EUA

Um júri decidiu ontem que Zacarias Moussaoui, o único condenado num tribunal dos Estados Unidos por envolvimento nos atentados de 11 de setembro de 2001, não deve ser executado, e sim passar o resto da vida na prisão. "América, você perdeu!", gritou Moussaoui ao deixar o tribunal depois do anúncio do veredicto. Ele bateu palmas e bradou: "Eu venci!"

Moussaoui, de 37 anos, cidadão francês de origem marroquina, será sentenciado formalmente hoje. Preso três semanas antes do 11/9, ele afirmou durante o julgamento que sua missão era pilotar um quinto avião nos ataques, lançando-o contra a Casa Branca. No processo, declarou-se culpado de seis acusações de conspiração - três das quais eram passíveis de pena de morte - e disse não estar arrependido.

A decisão de ontem foi lida pela juíza Leonie Brinkema num tribunal de Alexandria, Virgínia, não muito longe do Pentágono, alvo de um dos ataques de 2001. O porta-voz Edward Adams fez uma leitura simultânea diante das câmeras de TV no lado de fora do tribunal.

Na Casa Branca, o presidente George W. Bush saudou a condenação do homem que, segundo ele, "alegrou-se abertamente" com as mortes do 11 de Setembro. Bush afirmou que o "mal" foi derrotado.

"O fim deste julgamento representa o fim deste caso, mas não o fim da luta contra o terror", disse o presidente. "E podemos ficar confiantes. Nossa causa é justa e o desfecho é certo: a justiça será feita. O mal não terá a palavra final."

No tribunal, Moussaoui permaneceu sentado, orando em silêncio, enquanto Brinkema leu a decisão. Ele pareceu relaxar ao ouvir que os jurados não chegaram a um consenso sobre a imposição da pena de morte.

O júri concluiu que as ações de Moussaoui não provocaram a morte de cerca de 3 mil pessoas nos atentados - rejeitando uma peça central da argumentação do governo em favor da pena capital. "Nenhum jurado concluiu que a execução de Zacarias Moussaoui criaria um mártir para os muçulmanos fundamentalistas radicais e para a Al-Qaeda em particular", disse Adams. "Três jurados concluíram que o papel de Moussaoui na operação do 11/9, se existiu, foi menor." A pena máxima só poderia ser adotada por unanimidade.

Nove jurados deram peso à infância conturbada de Moussaoui e a sua vida familiar disfuncional, parte da defesa apresentada por seus advogados.

O governo, que pedia a pena de morte, já sofreu reveses em outros casos importantes na guerra contra o terrorismo.

Alguns parentes de vítimas disseram que Moussaoui recebeu o que merecia. Carie Lemack, cuja mãe, Judy Larocque, morreu no avião da American Airlines seqüestrado e lançado contra o World Trade Center, afirmou que ela não acreditava na pena de morte e teria ficado feliz com a condenação de Moussaoui à prisão perpétua. "Este homem era um aspirante à Al-Qaeda que nunca poderia ter organizado os ataques de 11/9", disse Lemack. "Ele é um aspirante que merece apodrecer na cadeia."

Rosemary Dillard, cujo marido, Eddie, morreu nos atentados, afirmou, referindo-se a Moussaoui: "Ele é um homem malvado, mas temos uma sociedade justa." Referindo-se aos terroristas, ela continuou: "Vamos tratá-los com respeito, não importa o que eles façam conosco."

Para ativistas contrários à pena de morte, o veredicto mostrou que os júris americanos estão menos dispostos que no passado a impor a pena capital, mesmo num caso tão perturbador quanto o de Moussaoui. Eles disseram que o número de condenações à morte impostas por júri caiu dramaticamente desde o fim dos anos 90 e continua a diminuir anualmente.

Os promotores federais haviam pedido a pena de morte argumentando que Moussaoui, detido antes do 11 de Setembro, deixou de informar as autoridades sobre o complô e portanto foi responsável direto pelos ataques.

Mas os jurados, que passaram 41 horas deliberando antes de chegar ao veredicto, ficaram divididos quanto à pena máxima. Dias antes, o mesmo júri de nove homens e três mulheres concluíra que o caso de Moussaoui era passível de pena de morte. O veredicto veio depois de uma segunda fase de duas semanas do julgamento.

Na bem-sucedida defesa de Moussaoui, seus advogados revelaram detalhes dos erros do FBI e outras agências governamentais ao lidar com as informações de inteligência antes dos atentados. Na fase final do julgamento, os defensores retrataram o réu como um esquizofrênico enganador. Eles argumentaram que Moussaoui confessou um papel nos ataques que na verdade nunca exerceu - tudo para alcançar o martírio pela execução ou obter reconhecimento histórico.

A defesa conseguiu superar o impacto de duas intervenções dramáticas do próprio Moussaoui - primeiro para desmentir a posição, mantida por quatro anos, de que não estava envolvido nos ataques, depois para se declarar feliz com a dor dos que perderam entes queridos.