Título: Demagogia no ensino superior
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Fonte: O Estado de São Paulo, 04/05/2006, Notas e Informações, p. A3

Pródigo em iniciativas demagógicas, o senador Paulo Paim (PT-RS) conseguiu aprovar mais um projeto delirantemente demagógico na Comissão de Educação do Senado. A pretexto de facilitar o acesso à educação superior de estudantes pobres, o projeto obriga as universidades particulares a oferecer "vagas semigratuitas", por meio da concessão de bolsas a pelo menos 15% de seus alunos. Pela proposta, que foi votada em caráter terminativo, 5% dos estudantes com renda familiar per capita inferior a um salário mínimo e meio terão 80% de desconto no valor da mensalidade. Os demais 10% terão um desconto de 50%. Para compensar as escolas, o projeto as autoriza a promover um "pequeno aumento" na mensalidade dos 85% restantes dos alunos.

Segundo o parlamentar gaúcho, sua iniciativa foi concebida para "ajudar" o País a atingir a meta do Plano Nacional de Educação de ter 30% dos jovens entre 18 e 24 anos em cursos superiores até 2011. "Se não existem recursos financeiros federais e estaduais para a oferta de mais vagas gratuitas (nas universidades públicas), as instituições privadas precisam regular o preço de suas mensalidades de forma a não impedir que uma parcela dos alunos, mesmo minoritária, aprovada para seus cursos, fique excluída por não ter dinheiro para pagar seus estudos", diz Paim.

"O exercício da liberdade de iniciativa na oferta do ensino é limitado pelas condições sociais da clientela. Um pequeno aumento no preço da mensalidade da maioria, somado a uma limitação indolor nos lucros dos empresários, poderá beneficiar cerca de 400 mil estudantes", diz Paim, após lembrar que o projeto beneficia os alunos carentes, "ao invés (sic) de facilitar a prática de protecionismos e clientelismo em matéria de direitos sociais".

Como a maioria das instituições particulares de ensino superior hoje estaria com mais de 40% de suas vagas ociosas, explica o senador, elas poderiam destiná-las para a concessão dos descontos. "É como fazem as companhias aéreas, que têm vagas nos vôos e fazem promoções com preços mais baixos para preenchê-las". Os argumentos são de um primarismo que justificaria cassação de mandato por quebra de decoro. Além do mais, são falaciosos, uma vez que, como o senador está farto de saber, já existe um programa específico de bolsas patrocinado pelo governo federal, o "Universidade para Todos" (ProUni), que vem alcançando excelentes resultados. O ProUni começou a funcionar em janeiro do ano passado e, desde então, já possibilitou o acesso de milhares de jovens de baixa renda a cursos de graduação e cursos seqüenciais de formação específica, oferecendo incentivos fiscais às instituições de ensino que aderiram a ele.

Além disso, ao prever "um mecanismo automático de ampliação de gratuidade proporcional à expansão da atividade privada no ensino superior", o projeto interfere na autonomia administrativa e financeira das universidades particulares, ferindo a Constituição. "A proposta é irresponsável", afirma o vice-presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior.

Falaciosa também é a afirmação de Paim, no sentido de que o aumento de custos que seu projeto acarretaria para as instituições privadas representa "uma limitação indolor" de seus lucros, não prejudicando "a rentabilidade dos investimentos". O parlamentar gaúcho se esquece de que muitas delas, pressionadas pelos altos índices de inadimplência e evasão escolar, já reduziram drasticamente o valor das suas mensalidades, nos dois últimos anos.

Portanto, ao obrigá-las a "conceder abatimento do valor contratual para prestação de serviços educacionais" e oferecer "vagas semigratuitas", o projeto pode pôr em risco o equilíbrio financeiro de muitas universidades privadas e confessionais. E quem mais sairá prejudicado com isso serão os próprios eventuais beneficiários do projeto. Isto porque, para sobreviver, muitas instituições não terão outra saída a não ser aumentar o número de alunos por classe e substituir professores com título de mestre e doutor por inexperientes bacharéis em início de carreira, comprometendo a qualidade do ensino, que já é baixa.

O projeto de Paim segue agora para a Câmara onde esperamos que os deputados lhe dêem o destino que merece: a lata do lixo.