Título: No Brasil, lei prevê igualdade para todos
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/06/2006, Economia & Negócios, p. B7

As regras brasileiras para o setor de telecomunicações prevêem isonomia de tratamento para os usuários e para prestadores de serviço de valor adicionado, como as empresas de internet. Isso não quer dizer que todos recebem a mesma condição de serviço. O cliente residencial que contrata uma banda larga mais rápida recebe a banda larga mais rápida. No entanto, a operadora é proibida de limitar a qualidade superior de serviço a um usuário ou um grupo de usuários. A oferta comercial vale para todos.

O mesmo acontece com as empresas de internet que dependem de sua rede, que não podem ter vantagens exclusivas mesmo que sejam parceiras comerciais ou pertençam a um só grupo econômico.

"Apesar de o assunto ser bastante discutido nos Estados Unidos, ainda não houve nem um início de discussão por aqui", afirmou Guilherme Ieno Costa, advogado especialista em telecomunicações. "Numa primeira análise, as empresas de internet teriam garantia legal de tratamento isonômico."

O artigo 61 da Lei Geral de Telecomunicações, de 1997, equipara o provedor de serviço de valor adicionado, como as empresas de internet, a um usuário: "Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e os deveres inerentes a essa condição".

Em seu artigo 3.º, a mesma lei enumera, entre os direitos dos usuários (e, portanto, das empresas de internet), o "acesso aos serviços de telecomunicações, com padrões de qualidade e regularidade adequados à sua natureza, em qualquer ponto do território nacional" e "não ser discriminado quanto às condições de acesso e fruição do serviço".

"Um conceito básico é que a camada de baixo (rede) não tem de se importar com a camada de cima (conteúdo)", afirmou Demi Getschko, conselheiro do Comitê Gestor da Internet no Brasil. "As operadoras de telefonia, por exemplo, não entram em detalhes do que está sendo conversado nas ligações."

A Associação Brasileira de Concessionárias de Serviço Telefônico Fixo Comutado (Abrafix), que reúne as grandes operadoras fixas brasileiras, preferiu não se pronunciar sobre o assunto, por não ter ainda opinião formada. No entanto, empresas que prestam o serviço de voz sobre IP (sigla em inglês de protocolo de internet) já começam a reclamar que algumas dessas empresas mexem na configuração de suas redes e dificultam as chamadas telefônicas via banda larga.

"Essa é uma questão que precisa fazer parte dos novos marcos regulatórios", afirmou o diretor-executivo da Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA), Alexandre Annenberg. "São necessários um regulamento claro e uma agência regulatória forte. Eu não tenho percebido por parte das empresas um posicionamento claro. Existem grandes dúvidas sobre o modelo de negócio e sobre perspectivas de novas fontes de receitas e novos serviços."

As operadoras de telefonia fixa enfrentam estagnação em seu serviço principal, enquanto a banda larga cresce rapidamente. No Brasil, elas fecharam 2005 com 39,6 milhões de linhas em serviço, o mesmo número do ano anterior. De outra parte, a banda larga com tecnologia ADSL, oferecida pelas teles, aumentou 64,2%, passando de 1,883 milhão de clientes em 2004 para 3,092 milhões, segundo o site Teleco.

O panorama na TV paga não é muito diferente. O total de assinantes cresceu 8,8% ano passado, para 4,101 milhões. O número de clientes de internet via cabo subiu 71,4% no mesmo período, atingindo 629 mil.

O fim da neutralidade, para as operadoras, seria uma forma de rentabilizar o avanço da banda larga, compensando a paradeira na atividade principal, e de se defender do crescimento da telefonia e do vídeo na internet. Em detrimento do usuário.