Título: Intelectuais divergem sobre exigência de contrapartidas dos beneficiados
Autor: Paulo Moreira Leite
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/06/2006, Nacional, p. A8

Profissionais ocupados com cidadãos às voltas com carências materiais, não se pode dizer que o mundo dos assistentes sociais seja pobre em idéias. Isso se comprovou em Brasília, durante o debate entre Ricardo Paes de Barros, respeitado pesquisador do Ipea, e a professora Beatriz Paiva, da Universidade Federal de Santa Catarina, intelectual que se define como "bolivariana", em referência ao pensamento do presidente da Venezuela, Hugo Chávez.

O debate atravessou o horário marcado e prosseguiu longe dos microfones. Os dois apóiam o Bolsa-Família, mas têm visões diferentes. Paes de Barros acha que esse tipo de ação poderia produzir resultados melhores se o governo cobrasse compromissos maiores dos beneficiados. Para Beatriz, a única restrição ao Bolsa-Família é a falta de dinheiro. "As bolsas poderiam ser maiores. E atingir um número maior de pessoas."

Pesquisador rigoroso, sem simpatias políticas explícitas, Paes de Barros reconhece os resultados do Bolsa-Família, mas acredita que seria possível avançar mais, a partir de exemplos de países que seguem um modelo econômico liberal, como o Chile, desde que o governo cobrasse contrapartidas mais rigorosas dos beneficiários. "Eu acho que seria possível cobrar compromissos assinados, para fazer uma parceria", afirma ele. "Os dados demonstram que as crianças são mantidas nas escolas com mais freqüência pelas famílias que devem fazer isso como contrapartida para receber um benefício."

Para Beatriz, os compromissos representam uma política de discriminação contra os pobres. "Por trás dessa medida se esconde a idéia de que a pessoa vive na pobreza porque não gosta de trabalhar e não tem disciplina. Mas está errado. A pobreza nasce da falta de oportunidades. Não é fruto de desvio de comportamento", diz. "Não faz sentido obrigar uma família a se alimentar pior e aumentar suas privações por não conseguir manter um filho na escola. Como o Estado pode justificar isso?"