Título: EUA rastreiam milhões de ligações
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/05/2006, Internacional, p. A14

Programa secreto de monitoramento telefônico pela NSA pode complicar nomeação de Michael Hayden para a CIA

Um programa secreto de monitoramento das chamadas telefônicas de milhões de americanos foi revelado ontem. Segundo o jornal USA Today, o procedimento, realizado pela Agência de Segurança Nacional (NSA), começou com uma ordem assinada do presidente George W. Bush, após os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001.

O programa da NSA consistia no rastreamento eletrônico dos registros de milhões de chamadas telefônicas. O objetivo seria buscar padrões capazes de indicar conexões com organizações terroristas dispostas a desencadear ataques contra o território americano ou instalações dos EUA em outros países.

De acordo com o USA Today, citando como fonte pessoas com conhecimento direto do programa, três grandes empresas telefônicas - AT&T , Verizon e Bell South - atenderam ao pedido da NSA e passaram a entregar seus registros à agência logo após os atentados de 2001.

O programa não envolve escuta, mas a análise dos números chamados em ligações feitas de telefones celulares, residenciais e de empresas. Uma companhia, a Qwest, recusou-se a entregar as informações solicitadas, alegando preocupações com a privacidade dos usuários e o temor de processos. A informação de ontem abre a possibilidade de inúmeros processos contra as empresas que atenderam ao pedido.

O presidente Bush afirmou que o programa é conduzido dentro da lei. "Nossos esforços estão concentrados na Al-Qaeda e seus conhecidos associados", disse ele.

O brigadeiro Michael Hayden, ex-diretor da NSA entre 1999 e abril do ano passado, que Bush nomeou na semana passada para dirigir a CIA, Agência Central de Inteligência, teve que dar explicações a senadores, ontem, sobre esse programa. A notícia da escuta foi divulgada na manhã em que ele iniciou visitas ao Senado, como preparativo da sabatina de sua confirmação na CIA.

A revelação pode complicar a confirmação de Hayden, que supervisionou o programa durante os quase seis anos em que dirigiu a NSA, entre 1999 e abril do ano passado. Ela realimenta e amplifica a controvérsia criada pela revelação, no ano passado, de que Bush autorizou a NSA a grampear telefonemas e monitorar de mensagens via internet sem autorização judicial. Mesmo senadores republicanos já mostraram sua relutância à nomeação de Hayden, tanto pelo fato de ele ser militar como por sua participação nos programas de escuta extrajudiciais autorizados por Bush.

A NSA tem a maior base de dados de telefones do mundo. A agência está, em princípio, autorizada a fazer a "mineração de informações", conforme o jargão dessa atividade. Mas a busca não pode envolver a identificação de indivíduos, por nome, endereço ou número de inscrição no programa federal da seguridade social que todos os americanos e residentes legais do país possuem. Nesses casos, a lei exige uma "causa provável". Segundo as organizações de defesa dos direitos individuais, não está clara a utilidade do uso da base de dados domésticos da NSA para investigações antiterrorismo.

Historicamente, as companhias sempre exigiram autorização de um juiz para atender a pedidos de informação do governo. Gene Kimmelman, diretor do Sindicato dos Consumidores, diz que por décadas as telefônicas operam com uma regra simples: "Sem ordem judicial não há informações sobre clientes e ponto."