Título: Derrotado, Blair muda gabinete
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Fonte: O Estado de São Paulo, 06/05/2006, Internacional, p. A21

Líder trabalhista perde eleições distritais da Inglaterra, na maior derrota desde que chegou ao poder em 1997

O primeiro-ministro Tony Blair introduziu ontem uma profunda reforma em seu gabinete abalado por escândalos e acusações de negligência. O anúncio de que 9 de seus 20 ministros seriam mudados aconteceu após duro golpe sofrido pelo Partido Trabalhista nas eleições distritais de quinta-feira na Inglaterra.

Blair teve de lidar ontem pela manhã com os piores resultados eleitorais do Partido Trabalhista desde que chegou ao poder em 1997. Apurados os votos de 173 das 176 câmaras distritais onde ocorreram eleições, os trabalhistas conseguiram 1.174 cadeiras, enquanto o Partido Conservador obtinha 1.711. "Foi uma vitória esmagadora", exultou o novo líder conservador, David Cameron.

Os conservadores controlam agora 68 distritos e os trabalhistas, 26. "Isso dá uma medida exata do desgaste do governo", acrescentou um assessor do Partido Conservador, apontado como o grande vencedor do pleito. Os trabalhistas ficaram em terceiro lugar, atrás dos conservadores e dos liberal-democratas, com uma fatia proporcional dos votos equivalente a 40% para os conservadores, 27% para os liberal-democratas e 26% para os trabalhistas.

O Partido Trabalhista sofreu também perdas em outras 31 áreas de Londres, mas a derrota simbolicamente mais significativa foi em Ealing, no oeste da capital. Há décadas, uma mudança no poder neste distrito é seguida por uma mudança no poder em Downing Street (sede do governo).

Tentando dar novo impulso em seu governo diante desse péssimo desempenho eleitoral, Blair fez uma profunda incisão no gabinete que afetou ministérios tão importantes como os de Relações Exteriores, Interior, Defesa e Educação.

Um dos poucos "pesos pesados" mantidos foi Gordon Brown, ministro da Economia e apontado com sucessor de Blair como líder do Partido Trabalhista e eventualmente na chefia do governo.

Numa decisão que não surpreendeu ninguém, o ministro do Interior, Charles Clarke, foi demitido na esteira do escândalo envolvendo mais de mil criminosos estrangeiros - entre eles assassinos e estupradores - libertados mas não deportados como prevê a legislação do país.

Clarke continuará a servir Blair no Parlamento e sua pasta será assumida pelo ex-ministro da Defesa, John Reid, que tem fama de competência e agressividade.

O vice-primeiro-ministro John Prescott perdeu perdeu seu "superministério", que cuida de habitação e planejamento urbano , como resultado de um romance extraconjugal com uma ex-secretária que escandalizou a opinião pública. Apesar da perda de poder, ele continuará como vice-primeiro-ministro. A sua manutenção já era admitida pelos analistas. Prescott é apontado como um homem-chave no governo de Blair. Isso porque ele tem grande influência sobre a ala esquerda do Partido Trabalhista, que acusa o primeiro-ministro de ter atropelado a ideologia da agremiação com as "inovações" introduzidas em seus nove anos de governo. Prescott funciona como uma espécie de barreira de contenção que impede a facção esquerdista de desestabilizar o governo. Ele também facilitaria as pretensões de Brown de suceder Blair, obtendo para ele o apoio da esquerda.

Entre todas as mudanças anunciadas por Blair, a que mais surpreendeu os meios políticos e jornalísticos foi o rebaixamento de Jack Straw. De ministro das Relações Exteriores ele passou para líder da Câmara dos Comuns - um cargo equivalente a ministro na Grã-Bretanha, mas de expressão relativa. Muitos analistas atribuem o afastamento de Straw ao fato de ele rejeitar o uso da força para resolver a crise nuclear iraniana, uma opção defendida por Blair.

No entanto, segundo The Guardian, foi o próprio Straw que pediu para sair. Ele será substituído por Margaret Beckett, a primeira mulher a chefiar a chancelaria britânica. Ela está no gabinete desde 1997. O fato de ela ser uma eurocética foi contrabalançado pela nomeação de Geoff Hoon, experiente político europeu e ex-ministro da Defesa, como ministro para Assuntos Europeus.