Título: Itamaraty sobe o tom com a Bolívia
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/05/2006, Economia & Negócios, p. B6

Governo defenderá os interesses da Petrobrás e dos consumidores: há um limite para a alta do gás, diz Amorim

Com três dias de atraso, o Itamaraty subiu ontem o tom da reação do governo brasileiro à decisão da Bolívia de nacionalizar o setor do gás e de pressionar pelo aumento dos preços do insumo. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, declarou que o Brasil optará por fontes alternativas de abastecimento caso a Bolívia insista em um aumento inadequado do preço do gás natural e deixou claro que o governo defenderá os interesses da Petrobrás e dos consumidores brasileiros de gás. Segundo Amorim, há um limite para a alta do gás.

O chanceler rebateu as críticas do Congresso e da opinião pública à posição oficial adotada para a questão e argumentou que uma reação "estridente" do Brasil levaria a Bolívia a radicalizar sua política.

"Vamos defender, sim, o interesse da Petrobrás. Vamos defender, sim, os interesses do consumidor brasileiro. Vamos defender, sim, o abastecimento do Brasil", afirmou. "Se o preço chegar a um determinado nível, pode tornar-se mais interessante usar óleo combustível ou gás liquefeito de petróleo, dependendo da atividade. Essas atividades (setores) têm de medir os preços que estão dispostas a pagar em função das alternativas de combustíveis que dispõem."

Segundo Amorim, o gás não é uma commodity, como o petróleo. O gás boliviano, ressaltou, é apenas um insumo "vendido na região para viabilizar atividades da mesma região". O ministro disse que isso ficou explícito no comunicado final do encontro entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva, Evo Morales, da Bolívia, Hugo Chávez, da Venezuela, e Néstor Kirchner, da Argentina, anteontem, em Puerto Iguazú.

Para ele, a participação de Morales no encontro abriu a perspectiva de diálogo sobre os preços. Portanto, o principal benefício do encontro teria sido evitar que a crise prejudicasse o abastecimento do setor produtivo nacional no curto prazo.

Ao indicar que o Brasil não será refém da Bolívia nas negociações que começam na próxima semana, Amorim alterou a lógica ditada pelo Palácio do Planalto nos últimos três dias. Até anteontem, o governo aceitava a iniciativa de La Paz, sob o pretexto da soberania, e era preciso manter aberto o canal de diálogo. Coube à Petrobrás reagir com mais pulso e ameaçar levar o caso à arbitragem internacional e de não investir mais na Bolívia.

Amorim, porém, rebateu as críticas à posição oficial brasileira. "Temos de fazer isso (defender os interesses da Petrobrás e dos consumidores brasileiros) sem usar de estridência, que só contribui para agravar a relação dos países, para dificultar uma solução."

Irritado com a imprensa, Amorim surpreendeu ao ser questionado se o governo teria optado por uma abordagem mais política que econômica. "O que você quer que eu faça? Que invada a Bolívia, que obrigue os bolivianos a colocar no poço o preço do petróleo? Não é o nosso método."