Título: Família quer nome de Florestan fora de ONG ligada ao PT
Autor: Gabriel Manzano Filho
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/05/2006, Nacional, p. A15

Filho de sociólogo cancela autorização a entidade

Em um encontro com a direção do Instituto Florestan Fernandes (IFF), num escritório de advocacia de São Paulo, a família do sociólogo morto fez ontem um pedido formal para que o nome da entidade seja trocado. O aviso foi dado pelo filho dele, o jornalista Florestan Jr., e ouvido pela presidente do instituto, Maria Teresa Augusti. Inconformado com o envolvimento da entidade - e, portanto, do nome de seu pai, uma das figuras mais respeitadas da universidade brasileira - em suspeitas de irregularidades na gestão do PT em São Paulo, Florestan Jr. informou que a autorização concedida seis anos atrás não está valendo mais.

"Não queremos fazer prejulgamentos, se houve ou não irregularidades", disse o jornalista. "Mas não é justo manter o nome dele misturado com essas denúncias. Queremos acabar com isso, em definitivo." O clima do encontro foi amigável e os representantes do instituto exibiram documentos para mostrar que nenhuma irregularidade havia sido praticada. Mas disseram entender a preocupação da família e se comprometeram a discutir internamente uma saída para o caso.

O descontentamento da família, que já era antigo, piorou na semana passada com a decisão da Justiça de quebrar o sigilo bancário de várias ONGs e fundações ligadas à ex-prefeita Marta Suplicy - entre elas o IFF. Segundo denúncia do Ministério Público, essas organizações, cerca de 8 ou 9, teriam participado de uma forma irregular de terceirização de serviços, recebendo contratos ilícitos que chegariam, no total, a R$ 12,8 milhões.

A investigação começou em 2004 e já naquele ano virou tema de campanha contra o PT. "Minha mãe viveu momentos terríveis, ficava inconformada de ver o nome do marido envolvido em debates eleitorais na TV - e sem ninguém para defendê-lo", diz Florestan Jr. Ele chegou a procurar o candidato tucano José Serra e pedir-lhe que evitasse citar o nome do instituto nas denúncias e debates.

FIM DE CASO

O acordo de ontem, embora dependa ainda de uma decisão oficial do instituto, representa o fim de um casamento considerado insatisfatório que durou 20 anos. Florestan nunca formou, com Lula e o PT, um triângulo perfeito. Ele já era sociólogo consagrado dentro e fora do País e um dos expoentes da Pontifícia Universidade Católica, quando se dispôs a entrar para a política nas eleições para a Constituinte, em 1986. Na época, disse que havia esperado a vida inteira por um partido com o seu perfil e que já estava velho e não podia adiar mais - tinha de ser o PT mesmo.

"Ele já manifestava então, a alguns amigos, o receio de que a cúpula petista, de formação sindical, caminhasse para a social-democracia ou para o esquerdismo radical, duas saídas que ele desaprovava", diz Haroldo Ceravolo Cereza, autor de "Florestan, a inteligência militante", uma biografia. Em Brasília, ele era um peixe fora d'água na bancada do PT, mas seu trabalho na Constituinte foi importante nas definições do capítulo sobre educação.

Quando a candidata Marta Suplicy pediu, em 1995, autorização para dar o nome de Florestan a uma fundação, a família hesitou. "Eu até pensei que talvez não fosse uma boa idéia", recorda o jornalista. Mas pesou o fato de figuras de peso, como Francisco de Oliveira e Azziz Ab'Saber, fazerem parte do conselho. Eleita para a prefeitura, Marta desligou-se do instituto e os intelectuais foram embora. O tempo passou, as denúncias se sucederam. Ninguém procurou a família para dar explicações nem se deu ao trabalho de defendê-lo publicamente. Faltava, apenas, um novo tropeço na imagem do instituto para a separação. A Justiça o ofereceu, e a ligação iniciada em 1996 chega agora ao fim.