Título: Grampos mostram participação de deputados em fraude no orçamento
Autor: Sônia Filgueiras
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/05/2006, Nacional, p. A4

Em gravações, parlamentares e assessores discutem valores e tratam com intimidade acusado de chefiar quadrilha

"Meu amigo" e "meu patrão". Assim o atual 4º Secretário da Câmara, João Caldas (PL-AL), e Darci Vedoin, o empresário e chefe da quadrilha que superfaturava a venda de ambulâncias para as prefeituras, se tratam, num dos grampos flagrados pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal na Operação Sanguessuga. Caldas - e mais de uma dezena de parlamentares - tinha contato direto com empresários envolvidos no esquema, que usava emendas orçamentárias para alimentar seus negócios. No caso de Caldas, a intimidade é reveladora, mas a conversa, nem tanto.

No diálogo, o deputado diz a Vedoin, segundo a PF, que precisa falar com ele pessoalmente. Este foi o trecho grampeado que levou a PF e o MP a incluírem o nome de Caldas na lista de 65 parlamentares, além de dois ex-parlamentares, enviada ao procurador Antônio Fernando de Souza para eventuais investigações. Há casos em que o grampo revela que deputados tiveram seus nomes citados - como Rodrigo Maia (PFL-RJ), Denise Frossard (PPS-RJ) e Eduardo Paes (PSDB-RJ) - porque emendas apresentadas por eles despertaram o interesse da quadrilha, não havendo nenhum indicativo de envolvimento direto dos parlamentares.

Mas há também diálogos carregados de indícios de envolvimento direto de parlamentares no esquema de corrupção da quadrilha. É o caso do deputado paulista Neuton Lima (PTB). Em uma conversa entre Vedoin e Luiz Antônio, este último informa ao pai que mandou "dez" (R$ 10 mil, de acordo com o relatório da PF) para o deputado. Também existem diálogos que indicam o pagamento de propina ao deputado cassado Ronivon Santiago (PP), preso pela PF na operação.

O nome do deputado Dr. Heleno (PSC-RJ) surge num diálogo entre Vedoin e seu filho. O empresário indaga se um depósito de R$ 30 mil fora feito, e Luiz Antônio diz que sim, contando suposto racha: R$ 19 mil deveriam ser pagos a Dr. Heleno, R$ 5 mil a "Marcelo do João Batista" - assessor do deputado João Batista (PP-SP) - e R$ 4 mil para "o cara do Heleno".

A aparente relação entre Dr. Heleno e a quadrilha, de acordo com as escutas, parece ter surgido com intermediação de Marco Antônio Lopes, lotado no gabinete da deputada Elaine Costa (PTB-RJ) e também preso na Operação Sanguessuga. Como seu assessor, Elaine aparece nos grampos. Ela conversa diretamente com Luiz Antônio, que, com seu pai, é sócio da Planam, que montava as licitações fajutas e superfaturadas. Segundo a PF, ela cobra o fornecimento de carros.

Em outra conversa de Luiz Antônio com o assessor Marcos, o empresário reclama de uma operação de compra e venda de um carro, engendrada no gabinete de Elaine. A certa altura, o empresário diz: "Vai dar merda pra essa mulher, cara, cês vão conseguir colocar essa mulher presa". Em seguida, repete: "Isso aí vai dar o quê? Que alguma coisa, é rolo, cara. Depois vai dar problema pra ela na prestação de contas, vai dar problema pra deputada..."

Encerra a conversa reclamando do gabinete de Elaine: "A gente trabalha com mais de sessenta aí, cê sabe disso; problemas tem, com certeza (...) mas o negócio dela é tudo problemático... Será que o errado somos só nós?"

No caso do deputado Nilton Capixaba (PTB-RO), as conversas apresentam indícios variados. Em primeiro lugar, o de que um funcionário do deputado levou dinheiro do esquema; em segundo, que Capixaba mantinha contato direto com os empresários, apresentava emendas utilizadas pelo grupo nos negócios com as prefeituras para compra de ambulâncias.

Os grampos mostram ainda o nervosismo crescente de Capixaba com o avanço das investigações e o vazamento, na imprensa, de denúncias sobre seu envolvimento em irregularidades na compra de ambulâncias por prefeituras de Rondônia. Há alguns nomes conhecidos entre os que mantinham contato direto com os empresários em seus gabinetes. Um exemplo é a deputada Laura Carneiro (PFL-RJ), que teve um assessor pego no grampo.