Título: A emenda dos 5 mil biônicos
Autor: Dora Kramer
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/06/2006, Nacional, p. A6

Uma emenda constitucional aumentando o número de vereadores em todo o País está pronta para ser votada na Câmara. Se for posta na pauta antes da eleição, tem grande chance de ser aprovada, porque os deputados querem agradar os vereadores, excelentes cabos eleitorais.

Segundo cálculos feitos pelo gabinete do líder da minoria, deputado José Carlos Aleluia, a mudança no cálculo do número de vereadores proporcionalmente à população das cidades vai provocar um aumento de mais ou menos 10% das vagas nas Câmaras Municipais, o que equivale a cerca de 5 mil vereadores.

A proposta já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça e pela comissão especial formada para examinar a emenda, cujo destino final agora é a pauta de votações do plenário.

Está, portanto, na dependência de uma decisão do presidente Aldo Rebelo e da pressão exercida pelos líderes. Estes, por sua vez, estão sendo intensamente pressionados pelos vereadores, principalmente aqueles que não se elegeram em 2004, mas ficaram na fila das suplências.

É que a emenda permite a entrada imediata em vigor da nova regra. Ou seja, se aprovada, cada município terá de refazer as contas dos votos e as Câmaras poderão chamar os excedentes para ocupar cadeiras sem que tenham, pela norma vigente à época do pleito, sido eleitos para tal.

Serão biônicos, pois receberão mandatos fora do período eleitoral.

Essa não é a única, embora seja a mais escandalosa, distorção da emenda que busca revogar uma decisão do Supremo Tribunal Federal tomada no início de 2004, definindo que deveria ser obedecida a proporcionalidade estabelecida na Constituição: municípios com até 1 milhão de habitantes teriam no máximo 21 vereadores; com 5 milhões de habitantes, no máximo 41; e acima de 5 milhões, o teto seria de 55 vereadores.

Na prática, isso significou a extinção de 8.527 vagas de vereador - eram 60.276 em todo o País e passaram a ser 51.748.

Logo em seguida, a Câmara aprovou uma emenda reduzindo o corte das vagas para 5.062, mas o Senado não conseguiu aprová-la porque não foi alcançado o quórum de três quintos.

Os vereadores não sossegaram e continuaram no lobby para recuperar o terreno perdido. Em novembro de 2004, no mesmo ano da redução, portanto, e um mês após as eleições municipais, foi apresentada uma nova emenda criando outros sistemas de cálculo com base no aumento das faixas de população para fazer a proporcionalidade entre habitantes e número de vereadores.

O texto da proposta é feito para favorecer os vereadores de maneira desabrida. A começar pela quantidade das vagas recuperadas, praticamente a mesma da proposta aprovada pela Câmara e derrotada pelo Senado em 2004.

Além disso, a regra para as vagas a serem criadas é uma - os novos vereadores assumem no meio da legislatura -, mas é outra para as vagas que em alguns municípios poderão ser perdidas em função do novo cálculo: ninguém terá de sair. As vagas são extintas mas, em nome do "direito adquirido" dos vereadores, eles ficam até o fim no exercício de seus mandatos.

Em matéria de casuísmo, poucas vezes se viu um tão perfeito e acabado. E, como convém a toda tramóia, a proposta para criar 5 mil vereadores biônicos até a eleição de 2008 tramita em meio àquele tipo de discrição já conhecida como o silêncio dos indecentes.

De ocasião

O candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, assegura que não sofreu nenhuma pressão dos companheiros de tucanato para defender o fim do instituto da reeleição.

Se o faz por convicção e iniciativa própria, trata-se do espetáculo do convencimento. Em janeiro, o então governador de São Paulo era dos únicos tucanos a ponderar que a reeleição deveria continuar, pois não havia sido suficientemente testada.

Além do mais, não seria correto os próprios inventores da reeleição defenderem agora sua extinção só porque ela já não atende a seus interesses.

Isso ele dizia antes de ser pré-candidato. Vinte e quatro horas depois da oficialização da candidatura, transformou-se em árduo defensor da tese que condenava.

Para quem condena o cinismo e a desfaçatez de Lula, querendo dele ganhar no "embate de personalidades", não é um bom começo.

Organograma

O ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro, disse com toda a convicção que a aliança do governo com o PMDB é "programática".

Deve estar se referindo à programação de cobrança e ocupação de cargos públicos, o único programa ao qual o PMDB empresta - ou aluga - sua fidelidade.

Seca-pimenteira

O desempenho assim, assim de Ronaldo no primeiro jogo, não tenham dúvida, hoje será atribuído pela oposição a praga de vocês todos sabem quem.