Título: Luta entre palestinos facilita estratégia de Olmert
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Fonte: O Estado de São Paulo, 14/06/2006, Internacional, p. A10

O primeiro-ministro de Israel, Ehud Olmert, chegou ontem a Paris para uma visita de três dias. Uma indicação de que as relações entre França e Israel, há pouco tempo insuportáveis , estão agora mais serenas, mesmo diante do fato de Israel continuar sem ter um embaixador na capital francesa.

Esse apaziguamento permite a Olmert apresentar seus projetos com vistas a uma estabilização do conflito entre israelenses e palestinos. Ele pretende remover as colônias judaicas isoladas na Cisjordânia e reagrupar os colonos em blocos. Até aqui, não existe objeção, nem da parte dos ocidentais nem da França. Mas há um inconveniente: Olmert gostaria que esses blocos fossem anexados a Israel, com um "muro de segurança" que os israelenses edificariam em território palestino.

Essa última parte do plano inquieta a França, que rejeita a idéia de que seja traçada uma fronteira por decisão unilateral de Israel. E é nisso que Olmert deve usar toda sua eloqüência para convencer Chirac. Olmert se justifica, afirmando que sua prioridade é chegar a um acordo com os palestinos. Mas acrescenta: "No momento, os palestinos estão se matando. O Hamas está no governo. O que ocorrerá se, apesar de nossas tentativas, nada resultar? Continuamos a esperar, sem fazer nada, mais 5, 10 ou 15 anos?" O ponto principal das discussões com Chirac será, na realidade, a situação entre os palestinos. A cada dia os territórios palestinos se aproximam de uma guerra civil.

Essa é a conseqüência inesperada, perversa, da "democratização" desejada pelo Ocidente. Em janeiro foram realizadas eleições livres nos territórios palestinos. O resultado foi catastrófico, com esses territórios esquartejados entre duas "autoridades" inimigas.

De um lado, a autoridade do presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmud Abbas, líder da Fatah, homem notável que luta para que os palestinos reconheçam a existência de Israel e cessem seus ataques terroristas. De outro, o governo palestino, composto de homens do Hamas, grupo violentíssimo que sempre se recusou a reconhecer a existência de Israel.

Num certo sentido, essa luta interna entre os palestinos facilita a estratégia de Olmert. Como neste momento, ele poderá sempre sustentar que Israel está disposto a fazer concessões, mas nada será possível enquanto os palestinos da Fatah e do Hamas continuarem se digladiando com armas pesadas.

De um lado, Olmert necessita da colaboração da Fatah (os moderados palestinos), de Abbas, para que seja aceito seu plano de separação. É por isso que o líder israelense se dá mesmo ao luxo de lamentar a situação do "pobre Mahmud Abbas" e propor-lhe ajuda.

Olmert declarou ao jornal Le Figaro que "não se está longe da guerra civil" nos territórios da AP. "Os palestinos estão atirando uns contra os outros", disse ele. "A AP está dominada por uma organização terrorista, o Hamas, um bando de facínoras com sangue nas mãos. Acho que o presidente Mahmud Abbas é o instrumento legítimo dos palestinos para tentar mudar as coisas. Temo, porém, por sua vida. Por isso autorizamos a venda de armas à sua guarda pessoal, para protegê-lo." Olmert reiterou, porém, que Israel "jamais" voltará às fronteiras de 1967, o que significaria desocupar não só toda a Cisjordânia e a Faixa de Gaza, como também Jerusalém Oriental.

Olmert afirmou que rejeita a escalada da violência no âmago da AP, entre os moderados de Abbas e os exaltados do Hamas. Mas, quando pressionado, o primeiro-ministro israelense confessou querer o fim do governo do Hamas: "Quero que esse governo do Hamas desmorone, mas sem violência."

Percebe-se que a estrada é longa. As reuniões com Chirac permitirão, talvez, retirar algumas pedras desse caminho, mas assim mesmo ainda restarão muitos obstáculos.

*Gilles Lapouge é correspondente do 'Estado' em Paris