Título: Plantio pode cair, apesar do socorro
Autor: José Maria Tomazela
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/06/2006, Economia & Negócios, p. B14

Produtores mais pessimistas prevêem queda de até 30% por causa da redução da área cultivada

Apesar do pacote de medidas anunciado pelo governo no Plano de Safra 2006/07, os agricultores vão investir menos no plantio de grãos neste ano. Os mais pessimistas prevêem queda na produção de até 30%, em decorrência da redução da área cultivada e da aplicação menor de insumos.

A previsão do governo de colher 130 milhões de toneladas dificilmente vai se confirmar. A um mês do início do plantio, a maioria dos produtores está sem crédito e não conseguiu comprar calcário, sementes e adubos na quantidade suficiente para manter as áreas de plantio da última safra.

Os R$ 41,4 bilhões liberados pelo governo federal para o custeio e comercialização não estarão disponíveis para os inadimplentes da safra 2004/05, que são muitos.

A renegociação da dívida, que em todo o País atinge R$ 27 bilhões, não beneficia produtores que devem para o setor privado e que constituem a maioria. "O agricultor está com um pé atrás e deve deixar a decisão do plantio para a última hora", avalia Guilherme Almeida, gerente da Sul Paraná, distribuidora de defensivos e sementes de milho em Itapeva, sudoeste do Estado de São Paulo.

Segundo ele, as vendas estão quase 50% abaixo dos volumes normalmente registrados nesta época nos últimos anos. A Fazenda Agropecuária São Paulo, em Taquarivaí, grande produtora de milho, soja e trigo, decidiu rever a programação de plantio que previa aumento na área de produção."Vamos manter o cultivo em 1,7 mil hectares, mas não sabemos o que fazer com outros 360 hectares", disse o administrador João Jacintho.

Na região, tradicional produtora de trigo como cultura de inverno, a semeadura do grão está se encerrando com redução de 50% da área cultivada. Segundo o agrônomo Vandir Daniel da Silva, da Secretaria de Agricultura do Estado, a queda pode influenciar o plantio de soja e milho no verão, feito geralmente sobre a palhada do trigo.

"É possível prever uma queda de pelo menos 10% também na área dessas culturas", observou. Segundo ele, o plantio do trigo foi influenciado pelas condições climáticas, pois há 60 dias não chove.

"Mas o produtor ficou decepcionado com as medidas do governo, pois esperava preços mínimos de garantia mais elevados", conta. Silva diz que, por ter investido em tecnologia, comprando tratores, pivôs de irrigação e construído silos, o agricultor está endividado, mas não pode deixar de plantar.

"A saída é reduzir custos, buscando sementes mais baratas, reduzindo o fertilizante e as horas de funcionamento dos pivôs de irrigação", disse ele. Com isso, acredita, a produtividade deve cair.

DÓLAR NA MIRA

O produtor Frederico D'Avila, da fazenda Jequitibá do Alto, município de Buri, não pretende reduzir a área de plantio, mas vai economizar no adubo e nas sementes e trocar áreas de milho pela soja, de custo mais barato. Segundo ele, o pacote do governo foi decepcionante. "O cenário continua tão ruim quanto estava e só o dólar a pelo menos R$ 2,70 pode trazer esperança."

Muitos produtores de soja estão retendo o produto à espera de alta na moeda americana. Na Cooperativa Agroindustrial de Itararé (Capal), o movimento de carretas para o Porto de Santos, retomados após a onda de bloqueios das rodovias durante o protesto dos produtores, está parando por falta de produção para escoar.

Na Cooperativa de Cafeicultores da Média Sorocabana (Coopermota), de Cândido Mota, no oeste paulista, o cenário é o mesmo. O atraso na comercialização da soja reflete nas compras para o próximo plantio. "Está todo mundo em compasso de espera", disse o presidente da cooperativa, Oscar de Góis Knuppel.

Na região de Presidente Prudente, as vendas de máquinas e tratores novos estão paradas. "Temos recebido só ofertas de tratores usados", disse Calixto Silveira, gerente de uma revenda.

De acordo com o pesquisador Sidnei Gonçalves, do Instituto de Economia Agrícola (IEA), houve uma queda superior a 20% na contratação de financiamentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para a agricultura. Ele acredita que a redução na área de plantio não será muito significativa porque, para o agricultor endividado, não existe a alternativa de não plantar. Ele considera, porém, que uma redução entre 6% e 7% é inevitável.