Título: 'Espiões' levaram 570 para a cadeia
Autor: Adriana Fernandes e Fabio Graner
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/06/2006, Economia & Negócios, p. B9

Se necessário, eles não dispensam peruca e bigode falso. É preciso ficar 'invisível'. Espalhados pelo País, eles estão por trás das maiores operações de combate a fraudes, que desmantelaram nos últimos anos esquemas de corrupção, contrabando, pirataria e sonegação fiscal.

Pouco conhecido do cidadão comum, o esquadrão de agentes secretos da Receita Federal ajudou a desbaratar, por exemplo, o esquema de subfaturamento das importações feitas pela famosa loja de artigos de luxo Daslu, freqüentada por políticos, celebridades, socialites e empresários.

Em 2006, eles já participaram de 12 megaoperações. Outras ações estão sendo preparadas e devem ser deflagradas nas próximas semanas. Desde 2003, foram 570 prisões resultantes de operações que partiram de investigações da área de inteligência do Fisco.

Por necessidade de sigilo, o chefe do esquadrão, Gerson Schaan, não dá detalhes sobre os próximos passos. Revela apenas que na lista das pessoas investigadas há "figuras carimbadas". "É importante estar invisível no transcorrer das investigações", justifica Schaan, coordenador de Pesquisa e Investigação da Receita. Um eventual vazamento da operação pode destruir meses de trabalho investigativo.

Com 133 agentes, a inteligência completa 10 anos este ano e se prepara para receber, nas próximas duas semanas, 38 novos espiões, homens e mulheres que estão na fase final de treinamento na Escola de Inteligência do Exército. Os futuros arapongas já fazem parte dos quadros da Receita e conhecem bem o funcionamento da administração tributária, pré-condição para serem aceitos no time. "Não recebemos pessoas verdes", diz Schaan. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin) também dá treinamento de táticas de contra-espionagem. Em agosto, agentes do Tesouro dos EUA vão dar um treinamento sobre fraudes financeiras. Apesar de comandar a equipe de espiões da Receita, Schaan se define como ex-espião, justamente por de ter uma maior exposição pública depois que assumiu a coordenação: "Minha carreira de agente secreto acabou", diz ele. Há sete anos na área de inteligência, Schaan não nega a saudade dos tempos em que estava nas ruas. "O mais emocionante é a vida no campo", diz. "Sinto falta daquela vida."

"As reações dos investigados são diferentes, o que exige atuação diferente em cada caso;É sempre uma novidade", afirma. Schaan diz que a área de inteligência ganhou fôlego com a aproximação e integração com a Polícia Federal e o Ministério Público. Essa parceria tem permitido que grandes sonegadores sejam presos.

Ao contrário do que acontece nos Estados Unidos, onde muitas vezes a Polícia usa a sonegação fiscal como instrumento para colocar as mãos em pessoas reconhecidamente criminosas atrás das grades, como no exemplo clássico do mafioso Al Capone, no Brasil a inteligência da Receita é que se serve da ação policial para botar as mãos nos sonegadores.

"Dificilmente alguém vai para a cadeia por sonegação fiscal no Brasil, por causa da extinção da punibilidade". A extinção de punibilidade permite à pessoa se livrar da prisão se o imposto sonegado for pago. Essa é a principal razão para não se encontrar nas prisões do País nenhum condenado por sonegação fiscal.