Título: Copom gira o foco para o exterior
Autor: Gustavo Freire, Fabio Graner
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/06/2006, Economia & Negócios, p. B10

Ata da última reunião diz ser necessário estar vigilante com o aumento da incerteza sobre a inflação futura

O nome do jogo agora é mercado externo. É essa variável que definirá os rumos da política de juros do Banco Central (BC) a partir de agora, segundo a ata da última reunião (dias 30 e 31 de maio) do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada ontem.

Os diretores do BC entenderam que, apesar de considerarem que o aumento da volatilidade nos mercados financeiros internacionais pode ser "transitório", é necessário "manter-se especialmente vigilante" com o aumento dos níveis de incerteza em relação ao comportamento da inflação futura.

O documento enfatiza que, se os riscos em relação ao comportamento da inflação se exacerbarem, o Copom estará pronto para agir. Ou seja, as taxas de juros podem ter menor ritmo de queda ou mesmo se manterem como estão, na melhor das hipóteses.

Essa ata é semelhante à anterior, de 18 e 19 de abril, até ao fazer a referência ao termo parcimônia. "O Copom entende que a preservação das importantes conquistas no combate à inflação e na manutenção do crescimento econômico, com geração de emprego e aumento da renda real, requer que a flexibilização adicional da política monetária seja conduzida com parcimônia", diz o documento, que ressalta, no entanto, "os sólidos fundamentos da economia brasileira".

"Tudo vai depender do comportamento dos mercados internacionais", disse o economista-chefe da Corretora Concórdia, Elson Teles, após ler o documento e concordar que a variável que está determinando o cenário é a volatilidade externa, motivada pelo temor da intensidade do ajuste da economia norte americana.

Mais pessimista, Alexandre Póvoa, diretor do Banco Modal, considerou o trecho do documento "envelhecido" ao qualificar a crise externa de transitória. "Creio que essa avaliação valia para a decisão tomada na semana passada, de reduzir os juros em 0,50 ponto porcentual", afirmou.

Para Póvoa, a decisão dos bancos centrais de vários países emergentes (Coréia do Sul, Índia, África do Sul e Turquia) de elevar as taxas de juros deixou claro que o atual quadro de incerteza parou de ser transitório e passou a ter um caráter mais permanente.

"Se a reunião do Copom fosse hoje, não teríamos espaço para novas reduções de juros", afirmou Póvoa. Ele admite, no entanto, que é difícil prever o que acontecerá nos dias 18 e 19 de julho, quando o Copom voltará a se reunir.

"Até lá, muita coisa pode acontecer", disse, referindo-se a decisão do BC dos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed) sobre os juros, no próximo dia 29. "Teremos um quadro mais consolidado para a avaliação do cenário externo na próxima reunião do Copom', comentou o economista da MB Associados Sergio Vale.

A aposta predominante no mercado é que os juros serão elevados em mais 0,25 ponto porcentual nos Estados Unidos. A dúvida é se o processo de alta será interrompido após essa decisão. "Na nossa avaliação, a taxa terá outra alta de 0,25 ponto porcentual e fechará o ano em 5,5% ao ano", disse Teles, da Corretora Concórdia.

Apesar das advertências de que o Copom está pronto para agir no caso elevação das incertezas em relação ao comportamento da inflação futura, o economista-chefe da Concórdia avalia que o cenário atual para a inflação é bastante confortável.

"Estamos com o IPCA acumulado em 12 meses até maio abaixo da meta de 4,5%", disse. Para ele, a taxa de câmbio poderá chegar até os R$ 2,40 sem causar grandes dificuldades para o cumprimento das metas deste e do próximo ano (4,5%).

Aliado a isso, o economista da MB Associados salientou que o crescimento da atividade econômica vem se dando dentro do melhor cenário esperado pelo BC. "Vimos que o principal fator para o crescimento do PIB no primeiro trimestre foi o aumento dos investimentos", disse.

A dúvida fica com o comportamento futuro do preço da gasolina. "O cenário central de trabalho (de reajuste zero neste ano) tornou-se progressivamente menos plausível e, portanto, aumentaram significativamente os riscos da sua concretização", diz o texto da ata da última reunião do Copom. Caso seja feito neste ano, o aumento provocado pela alta dos preços do petróleo no mercado internacional poderá, na avaliação de analistas de mercado, fazer com que a inflação feche o ano mais elevada que o projetado atualmente.

Outra fonte de incerteza apontada pelo Copom é o impacto do novo salário mínimo e da alta dos gastos públicos sobre a demanda, que podem provocar uma nova pressão sobre os preços. Mesmo assim, o economista da MB Associados avalia que o Copom ainda terá espaço para reduzir os juros em mais 0,5 ponto porcentual na próxima reunião.

"Depois disso, devemos ter uma última redução de 0,25 ponto", disse. Com isso, a taxa de juros terminaria o ano em 14,50% ao ano, a mais baixa desde a criação do Copom, em 1996.