Título: Não sou popular, mas tenho admiradores
Autor: Bruno Paes Manso
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/07/2006, Metrópole, p. C1

Apontadas como grave defeito na maioria das pessoas, as duas caras do prefeito Gilberto Kassab servem como estratégia para governar a maior cidade do Brasil. No trato pessoal, na relação com assessores, vereadores, secretários municipais e políticos, ele é um sujeito simples, que faz piadas para deixar o interlocutor à vontade diante da autoridade. Os gracejos futebolísticos são os mais usados no corpo-a-corpo. Principalmente para quebrar o gelo com os que o desconhecem:

- Não é mais o Serra. Agora sou eu, o Kassab. Mas fique tranqüilo. A única mudança é que o Serra era palmeirense e eu sou são-paulino.

Mas a informalidade e a descontração desaparecem quando assume o papel de prefeito e vai discursar ou dar entrevistas. Nesse momento, assume o papel de político sem graça e estratégico. Não faz piadas como Lula, nem declarações afiadas como seu antecessor, José Serra. Prefere evitar os conflitos violentos do jogo do poder.

Na quarta-feira, o Estado acompanhou um dia na agenda do prefeito. No primeiro evento, na Favela Heliópolis, Kassab mostrou-se acessível a crianças, senhoras e lideranças comunitárias. Na volta, pegou um helicóptero e em 15 minutos deixou a base da pirâmide para ficar entre os que estão no cume. Foi o palestrante de uma reunião com os 350 maiores empresários brasileiros, todos de grupos que faturam acima de R$ 100 milhões. Foi pontual com ricos e pobres, uma de suas obsessões. Também não perdeu a chance de fazer gracejos com seu hostess, o empresário João Dória Júnior, brincando com a fama de notívago de Serra:

- Dizem que não sou popular, mas sei que tenho admiradores. Fui visitar o secretário de Infra-Estrutura Urbana e Obras, Antônio Arnaldo, logo depois que assumi. Achei estranho que a mulher dele me encheu de mimos. Servia cafezinho, bolinhos, dizia que me admirava... Na despedida, ela revelou o motivo: "Desde que o senhor assumiu, meu marido janta em casa todo dia." No fim do dia, Kassab deu entrevista ao Estado, acompanhada de muita pipoca.

- Alô, é da copa? Aqui é o Gilberto. Vocês podem trazer pipoca pra gente?, perguntou o prefeito ao copeiro, que ouviu a resposta do outro lado do telefone.

- Como, que Gilberto? Gilberto, o prefeito.

A pesquisa mostra que 67% dos entrevistados não conhecem o senhor. O senhor se sente confortável sendo desconhecido?

Em todos os cargos que eu ocupei ao longo da carreira, nunca tive um posto com visibilidade compatível com a de um prefeito ou um candidato a prefeito. A renúncia do Serra foi uma peculiaridade. Foi no início do mandato, ele foi chamado pelo seu partido para concorrer a governador. Com a carreira que eu tenho, não é algo que me diminui, que eu tenha errado em alguma coisa. Acho natural. Não incomoda.

A pesquisa aponta que o seu pior desempenho é na Saúde e na Segurança. A que o senhor atribui essa avaliação? Como reverter?

Depois da crise do PCC, as pessoas que moram em São Paulo ficaram preocupadas com segurança. Fizemos convênio com o governo do Estado para comprar equipamentos para que a GCM, a Polícia Civil e a Militar conversem. Em pouco tempo, vamos baixar uma norma para que as montadoras tenham que incluir chips nos carros. Queremos que existam antenas monitorando a cidade inteira. Quando o carro passa, ela detecta, o que vai ajudar na área de segurança. Com parcerias com a iniciativa privada, também vamos instalar câmeras em subprefeituras.

Como foi a sua segunda-feira dos ataques do PCC?

Eu passei o sábado e o domingo plugado e online nas iniciativas do governo para ver onde a Prefeitura podia cooperar para compatibilizar as ações da Prefeitura com as do governo. Concentramos nossos esforços com a GCM nos corredores de ônibus, terminais, garagens, orientação da opinião pública, orientando secretários. Foi o pior dia da administração e acho que de todos os paulistanos.

E a má avaliação na Saúde? O que acha dela e como reverter?

Na Saúde herdamos uma situação difícil. Num primeiro momento, foi estabelecida a criação das unidades de Atendimento Médico Ambulatorial (Amas). Procuramos criar um plano para que até o fim desse ano criássemos uma Ama por semana ao lado de 50 UBSs. O que ela faz? Faz serviços de maior complexidade, para desafogar prontos-socorros e hospitais: 50 Amas significam 2,5% da rede. É bastante. Estamos investindo em dois hospitais em regiões carentes. Na zona leste, o Cidade Tiradentes, que está inaugurando agora em agosto, e o de M'Boi Mirim, que vai ser inaugurado ano que vem. Com a aprovação da Lei das OSs, nós já vamos ter a possibilidade de funcionamento na próxima semana da parceria do hospital com uma entidade. No entorno do hospital a mesma OS assume as parceiras.

Defender tolerância zero com publicidade nas ruas é uma tentativa de criar marca pessoal? Esse projeto tem o seu maior empenho?

Todos os projetos da Prefeitura estão tendo o meu empenho. É uma bandeira do Defenda São Paulo, do PSDB, de algumas lideranças do PFL e o próprio Serra falou do problema na campanha. Tentamos radicalizar a fiscalização, fizemos lei específica no centro, mas não deu certo. Tem um pouco da minha presença, mas porque eu sou prefeito. Mas se fosse o Serra, isso é a cara dele. Não tenho dúvida de que ele tomaria a mesma decisão.

Proibir a propaganda pode aumentar o valor da licitação do mobiliário urbano. Não é isso que motiva a Prefeitura?

Eu tenho sérias dúvidas sobre essa licitação do mobiliário. Não sei se sai. Eu trabalho mesmo com a idéia de tolerância zero. O secretário de Energia, Recursos Hídricos e Saneamento, Mauro Arce, me convidou pra tomar um café com o governador. Um dos itens era a publicidade, que ele estava licitando nas Marginais e renderia aos cofres do Estado R$ 30 milhões. Eles estavam preocupados com o projeto que enviamos para a Câmara e perguntou se a proibição era pra valer e que iria diminuir a receita do governo. Eu falei: se uma grande empresa colocar grandes banners no Palácio dos Bandeirantes, provavelmente vai trazer uma receita monstruosa. Mas não vale a pena. Estamos convencidos de que precisamos eliminar essa poluição visual, vale a pena, mesmo que paguemos um custo por isso.