Título: Forças dos EUA matam Zarqawi
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Fonte: O Estado de São Paulo, 09/06/2006, Internacional, p. A14

Casa onde o líder da Al-Qaeda no Iraque se escondia perto de Bagdá é bombardeada após delação de membro do grupo

Um bombardeio de caças americanos matou ontem o inimigo nº 1 dos EUA no Iraque, o jordaniano Abu Musab al-Zarqawi, líder local da rede Al-Qaeda e responsável por dezenas de atentados suicidas, seqüestros e decapitações. Os EUA ofereciam por sua captura US$ 25 milhões - mesmo valor anunciado pela cabeça de Osama bin Laden -, mas não informaram se alguém vai receber o dinheiro.

No ataque contra a casa em que Zarqawi estava reunido com assessores, em um vilarejo perto da cidade de Baquba, a noroeste de Bagdá, morreram também seu vice e líder espiritual, xeque Abdul Rahmal al-Iraqi, dois assessores, uma mulher e uma criança. Zarqawi foi identificado pelas impressões digitais, tatuagens e cicatrizes, segundo militares dos EUA. Um exame de DNA deve ser concluído amanhã.

Em um comunicado colocado num site de radicais islâmicos, a Al-Qaeda confirmou a morte de Zarqawi e prometeu que continuará com a Jihad (guerra santa). Curiosamente, o texto estava assinado pelo xeque Abdul, sugerindo que ele continua vivo. No entanto, os americanos dizem ter identificado o corpo dele.

"Nós sabíamos exatamente onde ele estava e escolhemos o momento certo", explicou o general Gary L. North, comandante das operações aéreas das forças da coalizão liderada pelos EUA no Iraque. Uma pessoa da Al-Qaeda no Iraque deu a dica sobre os passos do xeque Abdul. Sua localização permitiu o bombardeio, disseram os militares. O general William Caldwell advertiu que terroristas podem lançar uma onda de ataques nos próximos dias e apontou o egípcio Abu al-Masri como provável sucessor de Zarqawi

Aparentemente, o cerco a Zarqawi se apertou depois que ele pôs na internet, em abril, um vídeo em que aparece com uma metralhadora em uma região desértica. Semanas depois os americanos localizaram um esconderijo onde encontraram fitas com as filmagens, o que teria ajudado na identificação da área de Baquba como o local onde Zarqawi estaria.

O primeiro-ministro iraquiano, Nuri al-Maliki, deu a notícia do bombardeio numa entrevista à imprensa em Bagdá, tendo ao lado o embaixador dos EUA, Zalmay Khalilzad e o comandante das forças americanas no Iraque, general George Casey.

A eliminação de Zarqawi é um dos momentos mais importantes para as forças dos EUA e o novo governo iraquiano desde a prisão do ex-presidente Saddam Hussein, em dezembro de 2003. Zarqawi era o terrorista mais temido pelos EUA por representar o extremismo islâmico de Bin Laden, por sua brutalidade e por instigar a guerra civil entre xiitas e sunitas. Zarqawi desprezava os xiitas e, como Bin Laden, tinha como meta criar um Estado islâmico unificado em todo o mundo árabe.

A morte dele coincidiu com um passo fundamental para o novo governo iraquiano: depois de semanas de impasse, foram definidos os ministros da área da segurança - crucial no combate à insurgência (ler na página 15) que ontem produziu um saldo de 40 mortos no Iraque.

Apesar do grande feito, tanto as autoridades americanas e iraquianas como analistas políticos ocidentais e árabes procuraram ontem ser cautelosos quanto ao impacto que a morte de Zarqawi terá para a resistência armada e o terrorismo no Iraque. O grupo dele, formado principalmente por extremistas estrangeiros infiltrados no país, era apenas um entre mais de uma dezena que promovem atentados. Peritos estimam que a Al-Qaeda no Iraque abrigue apenas uns 5% da insurgência e teve seu poder exagerado pelos EUA, provavelmente como estratégia para contrapor a população iraquiana aos grupos rebeldes (mostrando-os como forasteiros). A insurgência é formada também por ex-membros das forças de segurança e do Partido Baath (de Saddam), nacionalistas e extremistas islâmicos iraquianos e curdos.

Zarqawi não era bem-visto pelos rebeldes iraquianos por ser estrangeiro e brutal, tendo causado a morte também de sunitas. Entre os próprios seguidores tinha o apelido de "xeque açougueiro". No mundo árabe, porém, as opiniões se dividem entre os que o vêem como um "mártir", por ter morrido lutando contra uma força de ocupação não-islâmica, e os que o consideravam nefasto ao Islã.

Ahmed Fadhil al-Khalayleh (o nome de registro de Zarqawi) tinha 39 anos e era de Zarqa, cidade pobre perto de Amã. Sua família recebeu ontem mais de cem parentes e amigos. Perto da casa, um grupo de crianças recebeu os repórteres a pedradas. "Deus queira que surjam mil Zarqawis para lutar contra os americanos", disse um parente. "Se for verdade, então estamos felizes porque ele é um mártir para o Islã", afirmou Saleh al-Hami, cunhado de Zarqawi. Hami foi preso depois, quando dava entrevista à TV Al-Jazira, do Catar. O governo da Jordânia se recusou a dar detalhes da prisão.