Título: CPI: relator poupa Carvalho e Dirceu
Autor: Rosa Costa e Luciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/06/2006, Nacional, p. A10

Parecer final pede indiciamento de 4 empresas e 79 pessoas, entre elas Antonio Palocci e Paulo Okamotto

O parecer final da CPI dos Bingos aponta a existência de um esquema de corrupção entre pessoas ligadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e empresários do jogo de azar, com infiltrações em várias áreas do governo. Apresentado ontem pelo relator, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), o texto apresenta também indícios de que o prefeito de Santo André, Celso Daniel, foi vítima de crime encomendado.

Garibaldi pediu o indiciamento de 4 empresas e 79 pessoas, entre elas o ex-ministro Antonio Palocci e o presidente do Sebrae, Paulo Okamotto. O ex-ministro José Dirceu e o chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, não foram incluídos, como chegou a ser cogitado. O relator alegou não ter conseguido reunir provas suficientes contra eles.

O Planalto controla atualmente a maioria dos votos na CPI e seus aliados prometem rejeitar o relatório, com a alegação de que as apurações não se restringiram a questões ligadas a jogos. Emendas ao texto poderão ser apresentadas até quarta-feira e a votação final está prevista para o dia 20.

O nome de Lula é citado quatro vezes no texto. A primeira quando é lembrado que Okamotto pagou contas do presidente e de sua filha Lurian. A segunda, na apresentação da denúncia de que sua campanha teria recebido R$ 1 milhão de bingueiros angolanos. A terceira, ao abordar a suposta doação de US$ 3 milhões que teria recebido de Cuba. E, por fim, quando é acusado pelo ex-petista Paulo de Tarso Venceslau de ter se omitido diante da extorsão de prefeituras do PT.

Os nomes de Carvalho e Dirceu constavam na relação recebida por senadores na noite de quarta-feira - estavam incluídos entre os indiciados por concussão (corrupção de funcionário público) e improbidade administrativa. Contrário à retirada dos dois nomes, o presidente da CPI, senador Efraim Morais (PFL-PB), disse que, se fosse ele, não teria feito isso. "Foi uma decisão pessoal; se eu fosse ele, não excluiria os nomes", comentou.

Garibaldi negou ter sofrido pressão do governo para mudar o parecer. "Eu posso até ter errado, até ter cometido um equívoco, mas esse equívoco foi cometido pela minha inteligência, minha consciência, não foi cometido por pressão de ninguém", afirmou. Sua decisão, na prática, ignora os depoimentos dos irmãos de Celso Daniel - João Francisco e Bruno - apenas na parte que atingem os dois petistas. Os demais citados por eles continuam na lista de indiciados.

Garibaldi foi, ainda, incoerente com o próprio relatório que detalha as tentativas de Carvalho de boicotar as investigações. João Francisco e Bruno Daniel disseram à comissão que o ouviram afirmar duas vezes, depois do assassinato, que era o encarregado de levar a São Paulo, "em seu Corsa preto", o dinheiro da extorsão recolhida em Santo André para entregar ao então presidente do PT, José Dirceu. A conclusão da comissão é de que o prefeito foi assassinado porque não concordou em desviar dinheiro do caixa 2 do PT para atender a interesses de pessoas envolvidas no esquema. Uma das vezes, Francisco disse ter ouvido Carvalho afirmar que, de uma só vez, chegou a entregar R$ 1,2 milhão a Dirceu.

EMENDAS

O senador Álvaro Dias (PSDB-PR) apresentou emendas para restaurar o texto original, mas são mínimas as chances de aprová-las - assim como o próprio relatório. "Discordamos do pensamento do relator, que não viu os indícios comprometedores que justificassem o indiciamento de certas autoridades", alegou Dias. "Há, sim, elementos para o indiciamento de quem articulou para alterar a versão de um crime de mando em crime comum."

No decorrer dos 11 meses de trabalhos da CPI dos Bingos, foram realizadas 81 reuniões para votar requerimentos e ouvir depoimentos. Em comum, o depoimento dos investigados ficou caracterizado pelas mentiras, sem que os parlamentares pudessem agir. É que muitos deles estavam protegidos por liminares do Supremo Tribunal Federal (STF) proibindo a comissão de prendê-los. O STF também foi ágil em proibir a investigação de dados decorrentes da quebra do sigilo bancário, fiscal e telefônico de Okamotto, do empresário Roberto Carlos Kurzweil, ligado a Palocci, e mesmo da juíza federal Maísa Giudice, acusada por dirigentes da Caixa Econômica Federal de dar liminares suspeitas em favor da Gtech.

No rol de indiciados, 35 constam no relatório preliminar que trata apenas da denúncia de cobrança de propina da Gtech. Estão entre eles três ex-presidentes da Caixa: Jorge Mattoso, Emílio Carazzai e Sérgio Cutolo, além de vários diretores. Na segunda fase de investigação, os nomes dos indiciados se referem a apurações sobre jogos e crime organizado, jogo e financiamento de campanhas eleitorais, máfia do lixo e assassinato de Celso Daniel, entre outros.