Título: Fracasso da reunião de Cancún pode se repetir
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/07/2006, Economia & Negócios, p. B6

O improvável acerto entre Estados Unidos e União Européia no capítulo agrícola não garantirá a conclusão exitosa da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) ainda este ano. Assim como aconteceu com a conferência ministerial da OMC em Cancún, em 2003, a negociação corre o risco de ser bombardeada pelas inúmeras agrupações de países em desenvolvimento, sob o argumento de que não foram atendidas nos pré-acordos em temas secundários.

Mesmo no círculo do G-20, a impossibilidade de conciliação plena entre Brasil e Índia sobre os interesses agrícolas e industriais gera nova possibilidade de racha. Hoje, na tentativa de dirimir parte desses riscos, o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, vai coordenar um encontro do G-20 - o grupo de economias em desenvolvimento que pretende resultados ambiciosos no capítulo agrícola - com os parceiros do G-90, as economias mais pobres.

"A unidade dos países em desenvolvimento é crucial para o sucesso da Rodada", declarou. "Não porque queremos fazer uma união comercial contra os países em desenvolvimento, mas porque temos coisas em comum." Mas o dilema continuará, sobretudo dentro do G-20. Membro também do G-33, que agrupa as economias menores, a Índia indicou que não comunga completamente da proposta do G-20 de corte médio de tarifas agrícolas de 54%. Essa oferta significaria redução de 51% nas tarifas européias. Mas para países como Índia e China, poderá superar os 54%, o que afetaria a agricultura de subsistência. Para analistas da OMC, essa fórmula permitiria aos Estados Unidos escoarem sua produção agrícola, depois dos cortes dos subsídios aos agricultores, para esses mercados atraentes "Os mecanismos defensivos contra os subsídios agrícolas são as tarifas. Minha única possibilidade de defesa é usá-las. Por que vou tirá-las?", disse o ministro do Comércio da Índia, Kamal Nath, irritado. "Em Hong Kong , decidiu-se que os países em desenvolvimento teriam mais acesso aos mercados agrícolas".