Título: Donos do cofre. E cheios de dedos
Autor: Angélica Santa Cruz
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/07/2006, Nacional, p. A9

Na quarta-feira, o goiano Martiniano Cavalcante foi escolhido presidente do comitê financeiro da campanha de Heloísa Helena à Presidência, pelo PSOL. Ele acompanhou a senadora até o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para registrar previsão de gastos de R$ 5 milhões. Na saída, uma aposentada chegou perto de Heloísa e disse: "Minha filha, tenho R$ 20 aqui na bolsa e posso te dar." No dia seguinte, o funcionário da copiadora do Senado soube e mandou dizer a Martiniano que também quer dar uns trocadinhos. Com R$ 40 mil em caixa - menos do que um grande partido arrecada em um só jantar de doações -, o tesoureiro assumiu a pedreira de tocar uma campanha de primo pobre. "Mas é limpa!", reage.

Na primeira eleição depois da confissão de Lula de que caixa 2 é prática comum no País, os tesoureiros das 7 campanhas presidenciais entraram oficialmente em campo na semana passada. Em alguns casos, integram listas tríplices, daquelas em que é difícil saber quem, afinal de contas, vai guardar a chave do cofre. Coube a eles correr para registrar o CNPJ dos comitês financeiros, imprimir recibos em gráficas e abrir contas bancárias para, só a partir dos próximos dias, receber contribuições. Nos intervalos, deram explicações sobre suas atividades.

Tesoureiro da campanha do presidente Lula, com teto estimado em R$ 89 milhões, o prefeito licenciado de Diadema, José de Filippi Júnior, explicou que perdeu o sono quando foi escolhido para ser sucessor de Delúbio Soares, o silencioso operador do mensalão. Na campanha do tucano Geraldo Alckmin, avaliada em R$ 85 milhões, o presidente do comitê financeiro, o jurista Miguel Reale Jr., disse que não vai atuar na captação direta - e garantiu a ausência de caixa 2.

MULTINACIONAIS NÃO

Longe de grandes eventos e de complicadas engenharias financeiras para arrecadar, os responsáveis pelas finanças das campanhas menores falam frases mais diretas. "Estamos na moda, né?", diz Marcelo Panella, da campanha orçada em R$ 20 milhões de Cristovam Buarque, do PDT. Com R$ 120 mil em caixa, ele conta que vai recusar doações de multinacionais - e pretende contar com "a ajuda de eternos simpatizantes do fundador do partido, Leonel Brizola".

Secretária em uma das empresas de José Maria Eymael, do nanico PSDC, Marisete Akao foi convocada para virar presidente do comitê financeiro do patrão. Aceitou porque é "boa com essa coisa dos números" e obteve a promessa de que não vai ter "essa coisa de caixa 2".

No primeiro dia de trabalho, encontrou o caixa do partido vazio. "Não tem nada. Zero", surpreendeu-se . Na quinta, ficou mais tranqüila ao saber que saiu de graça a atualização do jingle usado em três campanhas, aquele do refrão "Ei,ei, Eymael/ Um democrata-cristão". Mas ainda não tem idéia de como vai fazer para chegar aos R$ 20 milhões previstos. "O doutor Eymael tem credibilidade, né? Acho que é por aí."