Título: Mais greves no setor público
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Fonte: O Estado de São Paulo, 21/06/2006, Notas e Informações, p. A3

Dois anos após terem realizado uma das mais longas greves do setor público, causando transtornos para todo o País, os servidores da Polícia Federal (PF) voltaram a cruzar os braços, numa greve de advertência. O motivo, como sempre, é salarial. Em 2004, agentes, escrivães e papiloscopistas alegaram que, embora tivessem diploma superior, seus salários eram de nível médio. Acuado, o governo lhes concedeu um reajuste de 17%. Agora, com apoio dos delegados e peritos, as três corporações pleiteiam um reajuste linear de 30%, a ser pago ainda este mês, e mais 30% em 2007.

Atualmente, o salário inicial de um delegado federal é de R$ 8,9 mil. Embora esses vencimentos estejam entre os mais altos da administração pública, os policiais federais estão seguindo o exemplo dos auditores da Receita, outra corporação bem remunerada na administração direta. O salário inicial de um auditor é de R$ 7,5 mil, chegando a R$ 10 mil no topo da carreira, sem contar os qüinqüênios e outros benefícios funcionais. Em greve há um mês e meio, a corporação exige, a pretexto de "reposição de perdas", um reajuste imediato de 57% para o piso e de 27% para o teto. Além disso, eles estão pleiteando um plano de carreira que, se for acolhido pelo governo, elevará o salário inicial para R$ 16,3 mil e o final, para R$ 20,4 mil, mais as gratificações por tempo de serviço. Os auditores justificam sua pretensão alegando que têm diploma universitário e exercem uma função estratégica, arrecadando o dinheiro que movimenta o governo.

Quanto aos policiais federais, eles afirmam que encaminharam sua reivindicação em agosto do ano passado e que o ministro da Justiça assinou um documento no mês seguinte, comprometendo-se a acolhê-la. Mas, segundo eles, as negociações não teriam prosseguido por causa da irritação do Ministério da Fazenda com a atuação da PF no caso da quebra de sigilo do caseiro Francenildo dos Santos Costa, que levou à demissão de Antonio Palocci.

"Indiciamos o chefinho deles e agora estamos sendo discriminados, contra a vontade do presidente e do ministro da Justiça. A PF está sendo perseguida pelas viúvas de Palocci", afirma o presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapef), Francisco Garisto. "Nós fazemos as operações, o governo fatura politicamente e não temos o mínimo retorno", acrescenta o presidente da Federação Nacional dos Delegados da Polícia Federal (Fenadepol), Armando Coelho Neto. "Sabemos que fazemos a agenda positiva do governo e, no entanto, não estamos tendo nenhuma contrapartida", conclui ele.

Esses argumentos, evidentemente absurdos, dão a idéia da ousadia de determinadas corporações do funcionalismo em matéria de pretensão salarial. É esse também o caso dos integrantes do Judiciário. Embora estejam entre as categorias mais bem pagas da União, ao lado dos auditores e dos policiais federais, os serventuários da Justiça Federal, da Justiça do Trabalho, da Justiça Eleitoral e da Justiça Militar estão parados há dois meses, reivindicando aumento. E, na Câmara, a Comissão de Constituição e Justiça acaba de aprovar a criação de mais um plano de cargos e salários para os tribunais federais, a um custo estimado de R$ 5,2 bilhões.

Embora na administração pública existam setores do funcionalismo com vencimentos muito baixos, como, por exemplo, médicos e professores, as categorias melhor aquinhoadas recebem salários iniciais bem mais altos do que os que são pagos pela iniciativa privada para funções que exigem diploma superior. Tanto no setor industrial quanto no setor de serviços, é difícil encontrar pisos salariais equivalentes aos dos auditores e delegados.

Isso mostra mais uma vez a desordem do setor público, em matéria de remuneração. O que decide os salários de determinadas categorias do funcionalismo não é a importância de sua função e o volume de trabalho, mas, principalmente, seu poder de pressão. Como a legislação eleitoral proíbe a concessão de reajustes a partir de julho, essas corporações mobilizaram suas forças para tentar arrancar aumentos nos próximos dias.