Título: Bolívia entrega jazida a indianos
Autor: Agnaldo Brito
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/06/2006, Economia & Negócios, p. B14

Reserva gigante de ferro gusa, Mutún será explorada pela Jindal Steel; brasileira EBX foi excluída da licitação

Depois de expulsar o grupo brasileiro EBX, proprietário da siderúrgica de ferro gusa instalada na Província de Germán Busch, no extremo leste da Bolívia, o governo Evo Morales acaba de escolher a indiana Jindal Steel and Power para explorar a jazida de Mutún, uma das maiores reservas de minério de ferro do mundo. O complexo siderúrgico, que será desenvolvido pelos próximos 8 anos, será integrado, terá estrutura para a produção do minério, seu beneficiamento e até a laminação.

O grupo EBX, do empresário Eike Batista, era um dos concorrentes à exploração da reserva, mas foi excluído pelo governo Evo no episódio que marcou a ofensiva contra o empreendimento de US$ 150 milhões montado na região. Eike foi obrigado a desistir do negócio a partir do qual produziria 800 mil toneladas de ferro gusa por ano, numa primeira fase.

Para a exploração da reserva de Mutún, que ocorre próximo à divisa com o Brasil, a indiana Jindal Steel deverá apresentar em 60 dias uma proposta técnica. A licitação da reserva prevê a concessão exploratória de 50% da reserva, estimada em 40 bilhões de toneladas de minério de ferro. A indiana terá direito a explorá-la por 40 anos.

Hoje, não há absolutamente nada na área. A parca infra-estrutura para a pequena produção que existiu no passado é apenas ruína. Atualmente, serve apenas como base militar do Exército boliviano. A decisão do governo Evo de indicar uma empresa para tocar o negócio coloca a Bolívia no grupo mundial de produtores de aço. O investimento estimado para iniciar a exploração e o processamento do minério é de US$ 2,3 bilhões a US$ 2,5 bilhões.

Segundo o ministro do Desenvolvimento da Bolívia, Carlos Villegas, a previsão é que o empreendimento gere cerca de US$ 250 milhões em divisas de exportação. A produção deverá alcançar uma demanda de 1,5 milhão de toneladas de minério para a produção de 1,4 milhão de toneladas por ano de aço laminado. Tudo isso levará a um consumo de três milhões de metros cúbicos de gás por dia.

O empreendimento exigirá a construção de um gasoduto de 50 quilômetros e uma térmica a gás. O consumo de gás era uma das condições impostas pelo governo para a concessão. O projeto do grupo EBX, que previa quatro fornos (dois já praticamente prontos), usaria carvão vegetal para o processo de redução para produção do ferro.

A Empresa Siderúrgica Mutún (ESM), que representará o Estado boliviano no negócio com uma fatia de 48% das ações, terá cerca de US$ 20 milhões de participação, além dos US$ 30 milhões previstos em impostos. Os recursos que serão recebidos pela ESM serão divididos da seguinte forma: 30% serão dados ao município de Puerto Suárez, 15% para o Estado de Santa Cruz, 35% vão para a Companhia de Minério da Bolívia (Comibol) e 20% para o Ministério de Minas.

A definição da licitação provocou euforia na Bolívia, principalmente nos meios de comunicação. Virou um mantra no país o slogan do governo "Evo Cambia, Evo Cumple". A escolha foi anunciada estrategicamente na Câmara de Indústria, Comércio e Turismo de Santa Cruz, uma espécie de Fiesp boliviana, uma organização bem hostil ao novo governo. Deu certo. O anúncio contribuiu para minorar o mal estar entre o governo central e o Departamento de Santa Cruz, onde está a base do agronegócio boliviano - setor ameaçado pelo plano governamental de nacionalizar terras para a realização de uma nova reforma agrária.

EMPREGOS A expulsão do Grupo EBX gerou um movimento cívico na Província de Germán Busch, de 30 mil habitantes. A greve na região fechou a fronteira com o Brasil, além de interromper o tráfego em rodovias e ferrovias. O desmonte do projeto do empresário Eike Batista provocou mais de 800 demissões. A expectativa com a escolha da Jindall Steel para explorar o minério é de uma geração de 2 mil empregos diretos e cerca de 6 mil indiretos, na primeira etapa, mas com perspectiva de alcançar 10 mil diretos e 30 mil indiretos no longo prazo. O empreendimento deverá gerar um forte processo migratório de várias regiões do país para a fronteira com o Brasil.