Título: Edição de MPs trava mais de 80% das sessões da Câmara, revela estudo
Autor: Denise Madueño
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/07/2006, Nacional, p. A4

A Câmara passou a maior parte do tempo este ano com a pauta do plenário trancada por medidas provisórias e com pouco tempo para votar projetos de lei e outras matérias elaboradas pelo próprio Congresso. Das 71 sessões deliberativas - nas quais são marcadas votações - ocorridas de fevereiro até a semana passada, 60 foram obstruídas por MPs: 84,51% do total. Restaram só 11 sessões (15,49%) em que a pauta esteve livre. Os números são de um levantamento feito por técnicos da liderança do PSDB com base em dados da Mesa Diretora.

Com as MPs, o governo impõe a sua pauta de interesse e monopoliza os trabalhos do Congresso. Desde a mudança na regra das MPs, há quase 5 anos, o Congresso tem trabalhado em função de votá-las, mas este ano a situação se agravou.

A regra, instituída em setembro de 2001, obriga a votação de medidas provisórias até 45 dias depois de editadas pelo presidente da República. Em caso contrário, elas passam a ter prioridade na pauta do plenário, impedindo que outras matérias sejam votadas na Câmara ou Senado, dependendo da Casa onde estiver tramitando.

O governo tem aproveitado o poder de baixar essas normas com força de lei para tratar de diversos assuntos. Duas MPs que hoje trancam os trabalhos da Câmara, por exemplo, estabelecem regras que estavam em discussão na reforma sindical. Como a proposta não foi votada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva atendeu aos apelos das centrais sindicais e tentou apressar os principais pontos por meio de duas MPs.

Há medidas provisórias para compra de aviões, operação tapa-buraco nas estradas, concessão de reajuste salarial e criação de muitos cargos. No governo Lula foram abertos 2.930 cargos. Desse total, apenas 180 foram abertos por projeto de lei.

"Quem legisla é o Executivo, não tem conversa", protesta o deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP). "As medidas provisórias paralisam o Congresso." Ele avalia que, com a regra das MPs, o governo cria um clima de obstrução na Câmara quando é de seu interesse, controlando os trabalhos do Congresso.

ALERTA

Em 2001, quando a regra foi alterada, Madeira era líder do governo Fernando Henrique Cardoso na Câmara e alertou para o perigo da mudança que estava sendo aprovada. No discurso feito à época, ressaltou "a possibilidade de impactos futuros na governabilidade e na relação entre Executivo e Legislativo".

Apenas nos primeiros três meses de vigência da regra, em 2001, a pauta não foi trancada. Em 2002, 63,89% das sessões deliberativas da Câmara durante o ano legislativo, chamado no parlamento de sessão legislativa ordinária, estiveram trancadas. Era ano de eleição presidencial e o governo aproveitou para legislar, enquanto os parlamentares faziam campanha.

No primeiro semestre de 2002, foram 54 sessões deliberativas, das quais 28 (51,85%) com a pauta trancada. No segundo semestre, o caos se instalou na Câmara. Todas as 18 sessões deliberativas de 6 de agosto até 16 de dezembro começaram com a pauta trancada. Quando os deputados voltaram das campanhas, foram obrigados a votar MPs sistematicamente.

Em 2003, início do governo Lula, a Câmara esteve com a pauta trancada em 44,59% das sessões deliberativas. Foi o único ano em que as sessões livres superaram as que estavam com a pauta trancada, desconsiderando os períodos de convocação extraordinária. As convocações funcionam como sessões legislativas independentes.

Em 2004, das 125 sessões com votações do ano normal de trabalho, 97 delas (77,60%) tinham MPs no primeiro item da pauta. Porcentual semelhante foi verificado no terceiro ano do governo Lula. No ano normal de trabalho, das 149 sessões com votação ocorridas em 2005, 113 (75,84%) estavam trancadas.