Título: Silvinho depõe, não convence e oposição já fala em nova CPI
Autor: João Domingos, Mariana Caetano e Luciana N. Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/05/2006, Nacional, p. A4

Durante cerca de seis horas, o ex-secretário-geral do PT Silvio Pereira foi protagonista ontem de um dos mais confusos depoimentos já tomados pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bingos. Silvinho, como é conhecido o ex-petista, confirmou ter dado ao jornal O Globo a entrevista em que revelou detalhes do esquema ilegal de arrecadação montado pelo partido, mas disse não saber quando falou a verdade e quando recorreu "à ficção".

"Não posso dizer o que é fantasia, o que é coisa da minha cabeça. Pode ser que eu tenha dito a verdade, pode ser que não", despistou o ex-dirigente do PT, ao falar da entrevista que motivara sua convocação pela CPI. "Ela (a repórter que o entrevistou) não inventou nada, não mentiu. Não quero incriminar pessoas com base na entrevista. No conteúdo principal, não acho que tenha tido distorção. Se houve distorção, foi da minha cabeça."

Inconformados com as contradições e com as perguntas que Silvinho deixou sem resposta durante a sessão, os principais líderes da oposição insistiram na abertura de uma comissão específica, a "CPI do Silvinho", destinada a apurar o esquema urdido para abastecer os cofres do PT.

O ex-petista disse que, por falta de condições emocionais, não tinha lido a entrevista. Ninguém acreditou. Os parlamentares insistiam em citar trechos da entrevista até que o presidente da CPI, Efraim Morais (PFL-PB), decidiu ler a íntegra. "O senhor Sílvio Pereira não vai sair daqui sem conhecer a entrevista", disse o senador, impaciente.

Inicialmente abatido e reticente, Sílvio aos poucos ganhou confiança e, no fim do depoimento, falou com mais desenvoltura e atribuiu ao ex-companheiro Delúbio Soares as responsabilidades sobre tudo o que se referia a arrecadação de recursos e pagamento de despesas. O ex-dirigente poupou o presidente da República e disse ser "público e notório" que Luiz Inácio Lula da Silva era o "líder máximo" do PT.

Segundo o líder do PFL no Senado, Agripino Maia (PE), o fato determinante da nova investigação seriam as declarações de Silvinho sobre ações do publicitário Marcos Valério a fim de obter vantagens para bancos e empresas usando a influência que tinha no governo."Tem de manter a chaga aberta", disse Agripino. "O senhor diz que o esquema continua. Estou tendente a propor que se instale o prosseguimento da apuração desses fatos."

FRUSTRAÇÃO

O senador considerou o depoimento "absolutamente frustrante", porque o ex-secretário-geral do PT "protegeu o presidente Luiz Inácio Lula da Silva" e não quis repetir os detalhes sobre o esquema do valerioduto. O pefelista disse que o ideal seria uma acareação entre Silvinho e Valério: "Da maneira como ele descreveu, Marcos Valério era o presidente do País. Precisamos fazer um gesto político para que as coisas aconteçam."

Está marcada para hoje uma reunião dos partidos de oposição para decidir como agir depois do depoimento de Silvinho. O tema será discutido por dirigentes do PSDB, PFL, PDT, PPS e PV.

"Vai ser difícil fugir de uma nova investigação. Ele esclareceu muito pouco. Ele pensa que está nos levando no bico, mas não está", disse o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). O tucano deu "mais valor ao que ele não esclareceu", por ver pistas do que deve ser investigado daqui para frente.

O ex-secretário-geral do PT repetiu não lembrar exatamente o que tinha dito na entrevista sempre que indagado sobre a revelação de que Valério teria oferecido ao PT a opção de revelar tudo sobre o esquema, o que "faria cair a República". O ex-petista confirmou ter feito referência a essa ameaça do publicitário, mas disse não lembrar se ele mesmo tinha ouvido ou se soube de uma terceira pessoa.

Efraim considerou positivo o fato de Silvinho ter dito que a entrevista era verdadeira, embora não soubesse distinguir o que falou de verdade e o que era fantasia: "Ele confirmou que a entrevista é verdadeira e mentiu quando disse que não tinha lido, porque depois sentiu falta de um trecho que tinha falado e não estava na reportagem."

JORNALISTA

A CPI aprovou convite para que a jornalista Soraya Aggege deponha sobre a entrevista de Silvinho. Como é convite, ela não é obrigada a comparecer, ou pode fazê-lo na data que julgar mais apropriada.