Título: Empresas escondem casos de assédio sexual
Autor: Marina Faleiros
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/05/2006, Economia & Negócios, p. B18

Nesta segunda-feira, o presidente da Toyota nos Estados Unidos, Hideaki Otoka, pediu demissão diante de uma desconfortável acusação: sua ex-secretária, Sayaka Kobayashi, pede na Justiça de Nova York US$ 190 milhões de indenização, alegando que ele a assediava sexualmente.

O tema costuma ser tratado como tabu nas empresas, mas mesmo em casos menos extremos que o de Otoka- com pessoas menos conhecidas e indenizações menores - sempre arranha a imagem da companhia e prejudica seu clima interno. No Brasil, segundo o advogado trabalhista Marcelo Gômara, sócio de Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados, casos deste tipo também começam a aparecer nos tribunais, conforme o problema fica mais conhecido.

"As empresas deveriam tratar a questão de forma mais aberta e expor esta questão ao seu corpo de executivos, pois quem paga conta disso é o empregador", diz. Segundo ele, uma pesquisa da Organização Internacional do Trabalho do começo da década mostrou que 52% das mulheres economicamente ativas já foram assediadas. "Ou seja, é algo mais comum do que se pensa."

A publicitária A. S., que não quis se identificar, já viveu cenas parecidas com a de Sayaka. Ela também era secretária da diretoria de uma empresa nacional e seu chefe fazia elogios insistentes. "Eu sempre dava distância e mostrava que não queria aquilo. Ficava revoltada com a situação, mas precisava do emprego".

O maior problema aconteceu quando ele a convidou para um almoço, alegando que queria conversar sobre seu desempenho na empresa. "Não queria ir, mas ele insistiu muito. Falou que meu trabalho era excelente, mas logo começou a mudar de assunto e dizer que eu estava linda e se insinuou". Como refutou os elogios, foi demitida poucos meses depois, sob a alegação de não trabalhava bem.

De acordo com Gômara, a Justiça do Trabalho considera o assédio sexual se ele for praticado por um superior hierárquico (ver quadro). A indenização é sempre dada por danos morais e, em média, gira em torno de 100 salários mínimos no Brasil. "Mas já existe uma corrente que defende que a pena deve ser conforme o faturamento da empresa, para que ela sinta no bolso e faça programas internos de prevenção a isto."

Wilson Mileris, consultor de comportamento organizacional da consultoria Modus, acredita que o assédio sexual vai totalmente contra a racionalidade corporativa. "Isso mostra uma desestrutura emocional grande do gestor, que precisa usar do poder de seu cargo para assediar uma pessoa".

Segundo ele, todos perdem com este descontrole: "A vítima geralmente é quem perde mais, mas a empresa fica com a imagem abalada, o executivo pode perder o emprego e um exemplo muito ruim é passado para os subordinados."

Cecília Arruda, coordenadora do Centro de Estudos de Ética nas Organizações da FGV-SP, até já existem empresas que fazem cartilhas ou tentam de alguma forma dar dicas para evitar problemas deste tipo. "Mas o problema é que muitas vezes a pessoa assediada se deixa levar pelo medo de perder o cargo e o problema cresce mais ainda." Segundo Cecília, geralmente os casos de assédio nunca são isolados numa empresa, mas se repetem, e mesmo quando conhecido, ninguém tem coragem de resolver problema.

Este foi o caso de S. D. ao entrar como estagiária numa multinacional. "A empresa possuía diversos vendedores que assediavam e elogiavam as mais jovens de modo grosseiro, e nosso chefe dizia que as estagiárias tinham de alegrar a força de vendas", descreve.

Ela tentou contatar a supervisão, mas o problema persistiu: "As pessoas agem como se isto fizesse parte do jogo profissional, e que você não deveria reagir. Mas a nossa parte psicológica vai sendo minada, a ponto de perdermos a motivação para trabalhar."