Título: Aeroporto vira acampamento dos sem-avião
Autor: Denise Chrispim Marin
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/06/2006, Economia & Negócios, p. B8

O Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, transformou-se em acampamento de passageiros da Varig durante a madrugada de sábado. Pelo menos 60 passageiros acomodaram-se como puderam pelas áreas de espera e circulação, sobre malas, cadeiras ou no piso de mármore. Aos que pediram comida ou um hotel após o cancelamento dos vôos, os funcionários disseram que a empresa não tem dinheiro para pagar.

Com medo de ter a bagagem furtada, muitos não pregaram os olhos, como a costureira Lucília Frois. Ela veio dos Estados Unidos, com os três filhos e uma amiga, para visitar a família em Belo Horizonte. Deveriam ter viajado para Minas Gerais na sexta-feira pela manhã, mas às 4h de sábado ainda estavam em Guarulhos.

Passaram o dia peregrinando pelo aeroporto, tentando voar por outra companhia, mas foi em vão. Quando a noite chegou, desistiram de tentar. ¿Acamparam¿ no corredor, entre o balcão de embarque da Varig e da TAM. Os filhos e a amiga se acomodaram sobre as malas e Lucília ficou sentada, vigiando e tentando controlar as cãibras nas pernas. Estão sem tomar banho desde quinta.

Os cinco estavam só esperando o dia amanhecer para ir à rodoviária comprar as passagens de ônibus para Belo Horizonte. Eles gastaram US$ 4 mil com essa viagem ao Brasil. ¿Já estou sofrendo só de pensar na volta daqui a 45 dias¿, comentou. Uma funcionária da Varig insistia em dizer que todos os passageiros da companhia que passaram aquela madrugada em Cumbica estavam ali não porque seus vôos foram cancelados, mas porque aguardavam o horário das conexões.

O grupo de 40 médicos latino-americanos que participou do Congresso da Confederação Americana de Urologia, em Recife, provava o contrário. Eles deveriam ter partido para seus países na noite de sexta, mas só às 5h de sábado saberiam se iam ou não conseguir voar.

O grupo estava dividido no aeroporto. Uns tentavam cochilar pelos bancos, outros bebiam chimarrão e conversavam para passar o tempo. Era a primeira vez que esses médicos passavam a noite num aeroporto. Alguns deles garantiram que não deixariam barato. Assim que chegarem em seus países estudarão meios de processar a Varig. ¿À 1h já era pra eu estar em casa, dormindo confortavelmente na minha cama¿, comentou um dos médicos, às 3h30.

Enquanto isso, ao lado dele, o mineiro Alexandre Silva e a esposa Helena dormiam, não tão confortavelmente, na cama improvisada. Ela ocupou quatro bancos do aeroporto e ele deitou sobre duas malas, com uma terceira enrolada na perna. ¿Para não ter perigo de nos roubarem¿, explicou.

O casal está tentando retornar para Nova York depois de ter passado as férias em Minas. Fazia 6 anos que eles não vinham ao Brasil. Quando chegaram em Guarulhos, na sexta, foram avisados sobre o cancelamento do vôo. Talvez conseguissem embarcar no sábado pela manhã, para Miami. Não estavam confiantes. ¿Do jeito que está, vamos dormir por aqui mais umas duas noites. Bom seria se apagassem as luzes do aeroporto¿.