Título: Empresas buscam saídas e investem mais no exterior
Autor: Irany Tereza
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/06/2006, Economia & Negócios, p. B10

Empurradas pela desvalorização cambial e pela falta de acordos comerciais com os Estados Unidos e a Europa - os dois principais mercados consumidores do mundo -, empresas brasileiras estão acelerando investimentos no exterior. De acordo com dados do Banco Central, no primeiro quadrimestre do ano o volume enviado foi de US$ 3,475 bilhões.

Isso representou 73% do total de investimentos diretos externos recebidos pelo Brasil no período: US$ 4,748 bilhões. É a mais estreita distância no entra-e-sai de recursos. Tradicionalmente, a saída de investimentos brasileiros corresponde a 10% a 25% do que entra.

Poderia ser uma ótima notícia se estivesse apenas vinculada à busca da globalização pelas empresas brasileiras. Este fator existe, mas o resultado está muito influenciado pela fraca atratividade da economia doméstica, especialmente por causa do câmbio. A opinião é de especialistas, empresários e investidores.

¿O Brasil acabou perdendo competitividade e a Santista ficou sem saída no País¿, resume Marcelo Pereira Malta de Araújo, presidente do Conselho de Administração do grupo têxtil que está transferindo sua sede para a Espanha e vai investir em nova unidade no México.

¿O aumento explosivo de investimentos brasileiros no exterior é a comprovação de que o ambiente no País não é atraente para os investidores¿, afirma o pesquisador Armando Castelar, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão ligado ao Ministério do Planejamento. A internacionalização, como mudança estrutural, é francamente positiva, uma mostra de que, acompanhando a globalização da economia, as empresas estão buscando nível para competir com suas concorrentes estrangeiras. É um fenômeno que, diz o professor da PUC-SP, Antonio Correa de Lacerda (ex-Sobeet), vem ocorrendo há dez anos no Brasil.

Faz parte deste rol de empresas a Siderúrgica Gerdau, que iniciou seu lento caminho além fronteiras em dezembro de 1980 com a Siderúrgica Laisa, no Uruguai. Hoje, o grupo está também nos Estados Unidos, Canadá, Argentina, Uruguai e Chile, com 19 usinas no exterior, 12 delas americanas, mais do que as 11 instaladas no Brasil. Do US$ 1,8 bilhão de investimentos em modernização e atualização tecnológica, somente um terço será aplicado no País. A empresa também programa investir outros US$ 2 bilhões ampliando sua capacidade de produção mundial.

¿Nos últimos dois anos, as condições de investimento no País pioraram e agora algumas empresas estão repensando sua estratégia de localização. Ou seja, ao movimento positivo estrutural, de ampliação de atividades, juntou-se o movimento negativo conjuntural, com substituição da capacidade de produção e investimento¿, diz Correa de Lacerda.

Há um mês, em seminário realizado no Rio sobre multinacionais brasileiras, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, revelou que o estoque de investimentos brasileiros no exterior avançou 44% de dezembro de 2001 a setembro de 2005, de US$ 50 bilhões para US$ 71,6 bilhões, mas sustentou que isso não torna vulnerável o mercado doméstico. Ele também disse não acreditar que um dos principais motivos da ida das empresas brasileiras ao exterior seja o baixo crescimento econômico do País nos últimos anos, mas confirmou a tese de que, além da busca por competitividade, as empresas estão contornando problemas de barreiras tarifárias.

Malta de Araújo, da Santista, não esconde a estratégia: quer driblar as dificuldades de ingresso dos produtos nos Estados Unidos e Europa, pela demora do Brasil em fechar acordos comerciais. ¿Os Estados Unidos são o maior mercado consumidor do mundo. E nós produzimos bens de consumo. Precisamos estar lá.¿

Para Josué Christiano Gomes da Silva, vice-presidente do Grupo Coteminas e filho do vice-presidente José Alencar, o que está carimbando o passaporte das empresas brasileiras é a mistura de fatores bons e ruins. ¿Vamos investir nos Estados Unidos para montar cadeias de distribuição, venda e comercialização e estamos com uma base de produção no México, um investimento em torno de US$ 100 milhões. O mercado de bens de consumo está nos Estados Unidos e na Europa e a demora em firmar acordos com estes mercados cria uma situação dramática, principalmente para o setor têxtil¿, diz o executivo. Segundo ele, apenas 2% do faturamento da companhia hoje vêm de exportações. Há seis anos, eram 40%.