Título: Parlamentares terão de investigar 54 colegas envolvidos com fraude
Autor: Sônia Filgueiras
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/06/2006, Nacional, p. A14

Se quiser mesmo cortar na própria carne ao investigar o esquema de venda de ambulâncias superfaturadas compradas com emendas parlamentares, a CPI dos Sanguessugas terá que examinar, de imediato, a situação de pelo menos 53 deputados, além do senador Ney Suassuna (PMDB-PB) que, conforme os documentos apreendidos pela Polícia Federal e repassados ao Ministério Público e à Câmara, apresentam algum tipo de vínculo objetivo com os integrantes do esquema.

Deste grupo, pelo menos 25 parlamentares são suspeitos de ter recebido propina em troca da inscrição de emendas ao orçamento para compra de ambulâncias. Seus nomes estão associados a repasses de dinheiro nas planilhas contábeis que foram apreendidas em computadores de empresas do grupo - em especial da Planam - ou são citados como beneficiários de propina nas escutas telefônicas realizadas pela Polícia Federal. Contra eles, existem indícios consistentes.

Nos demais 29 casos, os grampos e documentos, aos quais o Estado teve acesso, indicam proximidade dos parlamentares com integrantes do esquema, em muitos casos confirmada por documentos como planilhas de acompanhamento de emendas, rascunhos de ofícios e e-mails trocados entre os envolvidos.

O grupo também inclui parlamentares cujos nomes estão registrados em documentos de referência do caso, como o arquivo conta-corrente, uma espécie de agenda com referências bancárias tais como nome, CPF, número da conta bancária, agência e banco dos clientes e fornecedores mais importantes para a realização da fraude.

Há ainda casos de parlamentares que mantêm ou mantinham até pouco tempo em seus gabinetes funcionários suspeitos de envolvimento ou de se beneficiarem com o esquema. Essa é a situação, por exemplo, do deputado Amaury Gasques (PL-SP), que tem em seu gabinete dois assessores identificados na planilha conta-corrente. Um deles é ex-funcionário da Planam. Gasques também abrigou na Câmara, por alguns meses, a ex-funcionária do Ministério da Saúde Maria da Penha Lino, presa na operação. "Estavam desempregados, tinham competência e foram contratados. Não tenho relação com esse esquema", diz o parlamentar.

Também mantêm funcionários ligados ao esquema deputados igualmente implicados nos grampos, como João Batista (PP-SP). Há ainda casos extremos. O suplente Ricardo Rique (PL-PB), que exerceu o mandato até o início deste ano, empregava nada menos que quatro pessoas na Câmara, cujos nomes estão associados a repasses da Planam, além de um parente.

No grupo dos suspeitos de terem se beneficiado com propina estão nomes já conhecidos, como o segundo-secretário da Mesa Diretora da Câmara, Nilton Capixaba (PTB-RO), o quarto secretário da Mesa da Câmara, João Caldas (PL-AL), e o deputado Pedro Henry (PP-MT). Todos, junto com outros 12 parlamentares, figuram nos registros da contabilidade da Planam. No segundo grupo está, por exemplo, o terceiro-secretário da Mesa, deputado Eduardo Gomes (PSDB-TO).

Os grampos da PF mostram que Gomes conversava e se reunia com Darci Vedoin, empresário apontado como chefe do esquema, para tratar de emendas. As escutas apontam que o deputado, que em razão do cargo tem direito a um gabinete no prédio principal do Congresso, teria oferecido o local, em um dos edifícios anexos da Câmara, para uma reunião com Darci e outros colegas deputados. Procurado, Gomes não deu retorno às ligações.

No caso do deputado Eduardo Seabra (PTB-AP), a proximidade com o empresário-chefe do esquema é evidente: "Darci, não me abandone, não me deixe sozinho", brinca ele, para na seqüência dizer que está ficando sem "oxigênio" na campanha eleitoral.

O deputado João Correia (PMDB-AC) surge nas escutas ligado ao ex-deputado Ronivon Santiago (PP-AC). Santiago diz para Darci que "está tudo acertado" para Correia colocar emendas em favor do esquema. Já a deputada Laura Carneiro (PFL-RJ) aparece nos grampos relacionada a Carlos Augusto Haas, conhecido como Guto, ex-policial e funcionário de uma prefeitura do Rio. Há registros de repasses a Guto, que usa o gabinete da parlamentar.

Dois integrantes do esquema - um deles preso na Operação Sanguessuga - também dizem nas escutas conhecer Laura Carneiro. "Um deles conheço. E ponto. O outro nunca ouvi falar. O Guto me ajuda em campanha, e só. Não indico empresa para prefeito e não tenho relação com ninguém desse esquema", afirma ela.