Título: Candidato, Lula chama tucanos de 'vozes do atraso' e se diz caluniado
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/06/2006, Nacional, p. A12

Na convenção nacional do PT que oficializou ontem sua candidatura à reeleição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva distribuiu estocadas na oposição, disse que fez muito mais do que os oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso e elogiou a própria administração. Com um discurso contundente, que durou uma hora e meia, Lula chamou tucanos e pefelistas de ¿vozes do atraso¿ , tratou a crise do mensalão como ¿condutas equivocadas¿ usadas pela oposição para generalizar culpas e disse ser vítima de calúnias e do preconceito das elites.

¿Hoje, as vozes do atraso estão de volta. E como não têm uma boa obra no passado e nem propostas para o futuro, fazem da agressão e da calúnia as suas principais armas¿, afirmou o presidente, ovacionado pela platéia formada por aproximadamente 4 mil petistas.

No salão do Minas Tênis Clube, decorado com balões nas cores da bandeira brasileira e painéis gigantes exibindo o slogan da campanha - ¿Lula de novo. Com a força do povo¿ -, o presidente só mencionou os adversários do PSDB e do PFL pelo pronome ¿eles¿. Não citou nenhuma vez o rival do PSDB, Geraldo Alckmin, embora tenha dirigido farpas na sua direção ao lembrar que a segurança pública - ponto fraco do tucano - é de responsabilidade dos Estados.

Mesmo se vangloriando de suas ¿realizações¿, Lula pediu aos petistas que não adotassem tom ufanista, como se a eleição já estivesse ganha, e indicou como deve ser um eventual segundo mandato, com prioridade para o crescimento com inclusão social e ampliação dos compromissos com os mais pobres.

Munido de uma série de indicadores positivos sobre os três anos e meio de sua administração, pontuou seu discurso com vários números desfavoráveis aos ¿oito anos de governo deles¿ - numa referência ao período em que Fernando Henrique foi presidente (1994 a 2002) - e afirmou que o povo não esqueceu o ¿abismo¿ deixado por seu antecessor.

Ao lado do vice-presidente José Alencar (PRB), que mais uma vez fará dobradinha com ele na chapa, Lula garantiu que os números da economia, no seu governo, são os melhores dos últimos dez anos, embora tenha admitido ainda não estar satisfeito com as altas taxas de juros.

¿Por mais que nos provoquem, não usaremos os mesmos métodos, pois temos armas limpas e poderosas¿, destacou, citando como exemplo de munição em estoque a comparação entre os dois governos. Mas ainda tentou manter um pé na retórica paz e amor: ¿Não preparem as armas. Preparem as pétalas de rosas para responder aos tiros dos adversários.¿

Lula iniciou seu discurso com elogios a Alencar, que há quatro dias escancarou sua mágoa com a demora do presidente em definir se ele seria ou não vice, e prometeu investir mais nas reformas num eventual segundo mandato, especialmente na tributária, agrária e da Previdência.

Entre o discurso que leu e a parte improvisada, Lula citou dez vezes a palavra ¿povo¿ e chamou ao palco seis ¿convidados especiais¿, beneficiários de programas como o Bolsa-Família. O tom intimista faz parte da estratégia de campanha, já que a aprovação a ele cresce entre as classes menos favorecidas. O presidente se emocionou em três ocasiões e chegou a ficar com a voz embargada quando falou da pobreza. Ao mencionar o programa ¿Luz para Todos¿, lembrou sua infância humilde e, olhos marejados, disse que era difícil para sua mãe cozinhar e costurar com a luz de candeeiro.

Depois, ao falar sobre a crise política que atingiu seu governo, Lula afirmou que os adversários tentaram se aproveitar de situações para passar a ¿falsa idéia¿ de que o governo do PT compactuava com atos ilícitos.

¿Enfrentei essa crise sem um minuto de ódio, de ranço político, sem falar mal de nenhum governo, sem procurar culpados pelos nossos erros e sem jogar debaixo do tapete as mazelas¿, afirmou, ao repetir que sua administração foi a que mais investigou e puniu a corrupção ¿em toda a história¿.

Pela primeira vez, Lula fez uma defesa veemente de seu partido.¿O Brasil precisa do PT para seguir em frente e o meu governo precisa do PT para governar¿, argumentou. Ainda sem coligação oficial fechada com o PSB e o PC do B, o presidente-candidato apelou para a necessidade de ¿coalizões sólidas¿ para lhe dar sustentação.

Sentados nas cadeiras vermelhas dispostas no palco da convenção, os presidentes do PSB, deputado Eduardo Campos (PE), do PC do B, Renato Rabelo, e até do PTB, Flávio Martinez, aplaudiram com entusiasmo. O PTB foi o partido que denunciou o mensalão, por intermédio de Roberto Jefferson.

Perto de Lula também estavam os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B-SP), seus aliados. Antes de entrar em sua quinta campanha presidencial, Lula tentou obter o apoio oficial do PMDB, mas não conseguiu. Por enquanto, sua coligação tem apenas o PT e o PRB de Alencar, mas é possível que a aliança seja engrossada pelos comunistas no dia 29.

Enquanto o presidente falava, estrelas do PT dançavam no telão atrás dele. No fim da convenção, sob uma chuva de papel picado, o som do jingle da campanha, um baião, tomou conta do clube. ¿É o primeiro presidente que tem a alma do povo e tem a cara da gente¿, dizia um de seus trechos. Mas o presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), não resistiu e, animado, puxou o tradicional ¿Olê, olê, olê, olá, Lula, Lula¿.