Título: Crise pode marcar primeiro fracasso da Lei de Falências
Autor: Alberto Komatsu e Mônica Ciarelli
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/06/2006, Economia & Negócios, p. B1

A nova Lei de Falências deu sobrevida à Varig. Mas parece que conseguirá só isso. A lei criada para dar chances a empresas em estado pré-falimentar - como Varig, Parmalat e outras 170 que recorreram às novas regras - parece que não terá força para salvar a lendária companhia aérea.

Criada há um ano, a Lei de Falências foi até moldada para permitir que as empresas de aviação pudessem usar o instituto da recuperação judicial, previsto no novo texto, como um arrimo para reerguer-se.

Para especialistas ouvidos pelo Estado, o desfecho do Caso Varig não significa, necessariamente, o fracasso da lei, mas mostra que, além de ajustes, o texto pode não ter passado pelo que o mercado chama de "teste de fogo".

"Acho que a situação da Varig é complexa demais para a nova lei. E não acho que a lei se torna um fracasso ao não permitir que a Varig sobreviva. Penso que é a Varig que não consegue reunir condições para aproveitar a chance que a nova lei deu", afirma Fábio Bartolozzi Astrauskas, economista e responsável por um estudo sobre a nova lei, apresentado na pós-graduação da Faculdade de Administração da USP.

Lei nova exige compreensões novas e, nesse particular, a de falências ainda pode enfrentar oposição na esfera jurídica. É o caso da decisão do juiz Luiz Roberto Ayoub, da 8ª Vara da Justiça Federal no Rio de Janeiro. Ele fez uma interpretação da lei, já contestada, ao blindar uma parte da Varig dizendo que dívidas trabalhistas, por exemplo, não atormentariam o ganhador do leilão realizado na última quinta-feira. O problema é que a Justiça trabalhista pode não interpretar da mesma maneira ao ser provocada.

"A grande chance da Varig estava no leilão, mas ninguém, com um mínimo de respeito por pareceres jurídicos, se dispôs a arriscar-se ante a interpretação do juiz Ayoub. São grandes as chances de o novo controlador ter de assumir o passivo trabalhista mais adiante. Diria que essa situação é algo quase certo", explica Maria Lucia Benhame, advogada trabalhista.

Essas incertezas, avalia Maria Lucia, tornam as operações de alienação de ativos de empresas em situação semelhante muito imprevisíveis. Foi o suficiente para tornar um fracasso o leilão da Varig.

DÍVIDA TRIBUTÁRIA

Um dos problemas da nova lei, que a Varig terá de enfrentar caso consiga sobreviver, é a dívida tributária. A lei diz que o plano de recuperação, aprovado pelos credores, precisa ser acompanhado das certidões negativas de débito tributário. Isso nem a Varig nem qualquer outra empresa em situação semelhante tem.

Segundo Thomas Felsberg, advogado que coordenou toda a negociação do plano de recuperação da Parmalat, um ano depois da vigência da lei, esse é um dos ajustes pelo qual a lei precisa passar. "Qualquer empresa que recorra à nova lei tem débitos com o governo e isso deve estar contemplado no plano. Não faz sentido estar fora", diz Felsberg.

Caio Marcelo Mendes de Oliveira, juiz da 2ª Vara de Falências e Recuperação Judicial de São Paulo, reconhece que esse é um problema da lei, que, por ora, não tem sido obstáculo para a homologação dos planos de recuperação. "É, de qualquer forma, um ponto a ser reparado na lei", observa.