Título: Guerra ao terror cria insegurança, diz estudo
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Fonte: O Estado de São Paulo, 13/06/2006, Internacional, p. A16

Um estudo do instituto independente britânico Oxford Research Group concluiu que há ameaças muito mais graves para o planeta do que o terrorismo internacional e que as ações da chamada "guerra ao terror" provavelmente só aumentarão o risco de atentados como os cometidos em Nova York, Madri e Londres.

"A resposta ao terrorismo tem de ser pensada numa perspectiva mais ampla, levando em conta a situação da economia, a saúde, o meio ambiente e outras ameaças de longo prazo à sobrevivência e ao bem-estar da humanidade", indicam os pesquisadores Chris Abbott, Paul Rogers e John Sloboda. A agenda de segurança está sendo seqüestrada por esta guerra ao terror - diz o texto - e pelos conflitos a ela relacionados, no Afeganistão, Iraque e, potencialmente, Irã. "A guerra ao Iraque entrou no quarto ano, o conflito no Afeganistão, no sexto ano. E nesses países a situação é cada vez mais instável e violenta. E o movimento Al-Qaeda está tão ativo como antes."

De acordo com os pesquisadores, a prioridade dada pelos líderes mundiais à guerra ao terror distrai os políticos das verdadeiras ameaças à segurança global. Também consome centenas de bilhões de dólares que poderiam ser aplicados em questões mais graves. Eles advertem que, a menos que sejam adotadas ações nos próximos cinco a dez anos para combater as raízes de problemas mais importantes do planeta, será extremamente difícil, se não impossível, evitar um mundo instável em meados do século.

O relatório intitulado Respostas Globais às Ameaças Globais - Segurança Sustentada para o Século 21 levou 18 meses para ser elaborado. Ele aponta quatro grupos de fatores que os autores identificam como as raízes dos conflitos e da insegurança no mundo de hoje - e também, como motivos provavelmente mais determinantes para futuros conflitos. São eles: as mudanças climáticas, a competição pelos recursos não renováveis, a marginalização da maioria da população e a militarização do mundo.

"Estes fatores são tendências mais propensas a conduzir a substancial instabilidade regional e global e à perda de vidas em larga escala, numa magnitude não alcançada por outras ameaças potenciais", diz o estudo, concluindo que, a longo prazo, as atuais políticas de segurança são autodestrutivas. Por isso, salienta, é necessária uma nova estratégia.

Os pesquisadores criticam os Estados Unidos e a Grã-Bretanha, acusando-os de estarem mais preocupados em manter o status quo através da força em vez de atacar as verdadeiras causas da insegurança mundial. Sugerem, então, uma política que denominam de "paradigma de segurança sustentado", em contraposição à guerra ao terror, que eles classificam como "paradigma de controle".

A principal diferença entre essas duas estratégias é que na guerra ao terror, liderada pelos Estados Unidos, o objetivo é controlar as ameaças à segurança por meio do uso da força, ou seja, atacando os sintomas. O estudo propõe que se combatam as causas das ameaças à segurança.

No caso das mudanças climáticas, por exemplo, o relatório observa que seus efeitos deverão provocar desastres naturais graves, aumento da escassez de alimentos e deslocamento de populações de zonas costeiras e margens dos rios. Isso provocará distúrbios sociais, crescente sofrimento humano, mudança nos padrões de habitação e o aumento dos fluxos migratórios.

Essas constatações não chegam, porém, a ser novidade, como indica o próprio relatório do Oxford Research Group ao citar um levantamento feito pelo Pentágono, no fim de 2003. Esse estudo identificava as mudanças climáticas como uma ameaça que eclipsaria no futuro a do terrorismo, pois "poderia resultar na perda de milhões de vidas em guerra e desastres naturais".

No item relativo à competição pelos recursos naturais, os pesquisadores britânicos destacam que os governos têm como obsessão de segurança nacional garantir o controle ou o acesso às fontes principais de energia, como o petróleo do Golfo Pérsico, o que acarreta mais conflitos e tensão nessa região.

Outras sugestões dos pesquisadores: ações para combater a pobreza, como meio de diminuir a marginalização social (fator potencial de conflitos); a suspensão e reversão do desenvolvimento de armas de destruição em massa, como estratégia principal para reduzir a militarização do planeta.

No capítulo sobre a marginalização da maioria da população mundial, um gráfico com dados da última década mostra que o número de cidadãos americanos mortos a cada ano pelo terrorismo internacional raramente supera duas dezenas. Em 2001, quando cerca de 2.500 pessoas morreram nos atentados de 11 de Setembro, outras 3.500 morreram nos Estados Unidos de desnutrição, 14 mil de doenças decorrentes do vírus HIV e 62 mil de pneumonia.