Título: Força de paz ganha apoio, mas não membros
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Fonte: O Estado de São Paulo, 26/07/2006, Internacional, p. A11

O apoio para o envio de uma força militar internacional ao sul do Líbano aumenta rápido, mas um pequeno problema segue sem solução: de onde virão as tropas? Os EUA descartam a participação de seus soldados, a Otan diz estar sobrecarregada, a Grã-Bretanha acredita que suas tropas já têm compromissos demais e a Alemanha afirma que só participará se o Hezbollah, a milícia libanesa que seria policiada, aceitar a idéia - algo muito improvável.

"Todos os políticos dizem que a idéia é 'formidável', mas ninguém diz quem enviará os soldados", afirmou um funcionário europeu de alto escalão. "Todos vão se oferecer para cuidar da logística no Chipre." Há forte apoio verbal a essa força em público, mas em particular existe o temor de que os soldados sejam vistos como aliados de Israel e tenham de combater os guerrilheiros do Hezbollah, que não querem estrangeiros, muito menos o Exército libanês, entre eles e os israelenses.

A história também pesa. A França - que considerou prematura a idéia da força - e os EUA são assombrados por sua última participação numa força multinacional no Líbano, após a invasão israelense de 1982, quando se envolveram na guerra civil libanesa e tiveram confrontos mortíferos com o Hezbollah. Eles se retiraram derrotados depois do ataque a bomba suicida do Hezbollah a um acampamento de fuzileiros navais americanos em Beirute, em outubro de 1983, que deixou centenas de mortos (ler abaixo). A posição pública do próprio Israel em relação a uma força internacional de paz tem sido receptiva, mas cética. O país insiste que a força deve ser capaz de realizar missões militares, e não só de manutenção da paz.

O primeiro-ministro israelense, Ehud Olmert, sugeriu que a força, com capacidade militar e experiência de combate, poderia ser formada por soldados de países europeus e árabes. O ministro da Defesa, Amir Peretz, falou em soldados de países da Otan. Mas Israel não percebe muita disposição de participação entre os principais países europeus. E seus funcionários sublinham que não aceitarão o fim das hostilidades antes de alcançar claros objetivos políticos. Pelo menos por enquanto, Israel apresenta uma visão ambiciosa, talvez irreal, do que a força faria. Quer que ela mantenha o Hezbollah longe da fronteira, permita que o governo e o Exército libaneses assumam o controle de todo o seu território e monitorem suas fronteiras para garantir que o Hezbollah não se reabasteça de armas.

A chanceler de Israel, Tzipi Livni, apresentou os objetivos domingo, em reunião com representantes dos governos britânico, alemão e francês. Livni lhes disse que o objetivo de Israel é desarmar o Hezbollah e que o Exército israelense ou uma força internacional teriam de fazê-lo, informaram funcionários dos quatro países.

Os europeus, incluindo Grã-Bretanha, Alemanha e França, defendem uma força internacional bem menos robusta, que respeitaria um cessar-fogo e operaria com o consentimento do governo libanês para apoiar a mobilização de seu Exército no sul.

Tal situação significaria que o Hezbollah, que integra o governo libanês, teria de participar de uma decisão que levasse a seu próprio desarmamento e à proteção de Israel, o que funcionários europeus consideram improvável.

SOLANA

Apesar das dificuldades, é grande a expectativa de que seja tomada alguma decisão concreta sobre a força de paz na conferência internacional que será realizada hoje em Roma. Funcionários de alto escalão da União Européia informaram que o chefe de Política Externa do bloco, Javier Solana, proporá formalmente no encontro a criação dessa força. Segundo as fontes, para ele o ideal seria que participassem tropas francesas, alemãs e espanholas, complementadas por soldados do Canadá, Turquia e Holanda, além de países árabes, como Egito e Arábia Saudita. Antes de embarcar para Roma, Solana disse que a força de paz para o Líbano deveria representar amplo leque de nações, para garantir o maior apoio possível. Deveria também ter um "robusto" mandato da ONU para usar a força se necessário.

A conferência de hoje reúne representantes de 18 países e organismos internacionais, como EUA, União Européia, ONU, Líbano, Egito, Arábia Saudita, Jordânia, Rússia e Itália. Israel não participará. O principal objetivo será definir um plano para o cessar-fogo na região e discutir a organização da força multinacional para a fronteira entre Israel e Líbano.