Título: Para Itamaraty, proposta é 'alucinada'
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Fonte: O Estado de São Paulo, 28/07/2006, Economia & Negócios, p. B1

O governo brasileiro não assistiria passivamente à sua possível exclusão do Sistema Geral de Preferências (SGP) dos Estados Unidos. A reação imediata seria a abertura de uma controvérsia na Organização Mundial do Comércio (OMC). Com essa ressalva, fontes do Itamaraty responderam ontem à "alucinada" ameaça do presidente do Comitê de Finanças do Senado americano, Chuck Grassley, de exclusão do Brasil e da Índia desse mecanismo, como represália por terem sido "grandes obstáculos" nas negociações da Rodada Doha da OMC.

Para o Ministério das Relações Exteriores, a declaração de Grassley não contaminará o encontro agendado entre a representante de Comércio dos Estados Unidos, Susan Schwab, e o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, amanhã no Rio de Janeiro. Em princípio, não seria um tema a ser tratado entre ambos.

"Dizer que Brasil e Índia não se empenharam nas negociações da OMC só pode partir de uma percepção equivocada", resumiu um diplomata. "Se assim fosse, por que a embaixadora Schwab viria ao Brasil no sábado para discutir a rodada com o chanceler brasileiro?"

No Itamaraty, a ameaça do senador foi avaliada como sinal de aquecimento das eleições legislativas nos Estados Unidos, marcadas para novembro deste ano. Revides comerciais e posições mais protecionistas são dois clássicos do discurso político orientado a agradar ao eleitor médio americano, sobretudo nos Estados mais dependentes da atividade agrícola.

Coincidentemente, Grassley vem de Iowa, uma das maiores regiões produtoras de grãos dos EUA, e responde por um comitê do Senado cujas atribuições se estendem também ao comércio internacional.

AMEAÇAS Criado em 1970, o SGP autoriza 11 países mais a União Européia a concederem reduções em tarifas de importação para produtos específicos de países em desenvolvimento, sem ferir as regras internacionais do comércio. Mas não chega a ser uma grande concessão das economias mais desenvolvidas. Nos Estados Unidos, a fatia de importações favorecida por todo o SGP não alcança 2% do total de bens adquiridos no exterior.

Nos últimos anos, o Brasil foi ameaçado várias vezes por Washington de ser retirado desse mecanismo, sob a alegação de não cumprir com requisitos na área de propriedade intelectual. Mas nada aconteceu. "Uma coisa é a declaração de um parlamentar. Outra coisa é uma atitude efetiva do governo dos Estados Unidos. Até agora, não tivemos nenhum sinal de que Washington retiraria o Brasil do SGP", afirmou uma fonte do Itamaraty.

Em 2005, o Brasil foi o terceiro país que mais se aproveitou do SGP americano, atrás apenas da Índia e de Angola. Do total de bens exportados pelo País para os Estados Unidos no período, de US$ 24,4 bilhões, cerca de US$ 3,6 bilhões, ou 15%, valeram-se das redução tarifárias autorizadas por esse mecanismo. Porém o Brasil deixou de usar ainda uma parcela de US$ 387 milhões. A Índia aproveitou o benefício para o embarque de US$ 4,2 bilhões - 22,3% das exportações totais daquele país em 2005.