Título: 'Assim não dá!'
Autor: Fabíola Salvador e Renata Veríssimo
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/06/2006, Economia & Negócios, p. B1

Roberto Rodrigues já havia comunicado ao presidente Lula sua intenção de sair, em caráter irrevogável. Segundo pessoas muito próximas a ele, a saúde de sua mulher o preocupa muito, e é motivo preponderante para que ele deixe o governo. Ponderam, no entanto, que enquanto ministro, Rodrigues manifestou profundo descontentamento com ações governamentais e chegou mesmo a dizer que deixaria a pasta com a famosa expressão: "Assim não dá!"

Num desses episódios, há dois anos, ele havia negociado com a Casa Civil e alguns setores mais radicais do PT que o governo ficaria distante da questão dos transgênicos, deixando para o Congresso a decisão final sobre a liberação do plantio e comercialização de produtos geneticamente modificados.

Para sua surpresa, a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente, sob olhares complacentes do governo, fez, com parlamentares, acintoso lobby para que o assunto atendesse mais interesses ideológicos que as razões econômico-sociais da agricultura. Rodrigues disse: "Assim não dá!"

Em outra ocasião, o ministro manifestou profunda irritação quando Lula vestiu o boné vermelho do Movimento dos Sem-Terra ao receber seus representantes e orgulhosamente apareceu na TV e na capa dos jornais. De novo, Rodrigues ressaltou: "Assim não dá!"

Mas ele foi ficando principalmente porque seus amigos, líderes rurais, sempre o convenciam a não sair, temendo que a substituição pudesse levar ao cargo alguém mais próximo das ações de derrubada de cercas.

Agora, tendo de dar mais atenção ao lar e aos negócios pois, como plantador de grãos, Rodrigues sente no bolso a queda dos preços agrícolas, o ministro decidiu ir para casa. Os amigos dizem que ele será lembrado não pelo que fez pela agricultura,mas pelo que impediu que fosse feito contra a produção. Evitar a proibição total dos transgênicos, a deturpação do Protocolo de Cartagena , o desmonte da Embrapa e do serviço de vigilância sanitária são alguns dos episódios que, segundo seus amigos, Rodrigues agregará a seu currículo de serviços ao setor rural.

Mas ele não conseguiu evitar que ganhasse corpo entre os fazendeiros um protesto sintomático. Eles passaram a ostentar nos carros um dístico que manifesta o aborrecimento no setor: "Lula, a nova praga da agricultura".

*José Carlos Cafundó é jornalista