Título: Presidente da Funai é investigado por viagens à Europa
Autor: Leonencio Nossa
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/07/2006, Nacional, p. A9
O Tribunal de Contas da União (TCU) investiga uma série de viagens do presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Mércio Pereira Gomes, a "aldeias" do Rio, Estados Unidos e Europa. Dois relatórios obtidos pelo Estado mostram que a agência Money Turismo emitiu, em nome de Mércio, num período inferior a três anos, 235 passagens aéreas no valor total de R$ 252 mil. Só para o Rio, onde ele tem residência, a agência emitiu 118 bilhetes. Há 16 emissões de bilhetes para cidades do exterior e apenas 12 para localidades da Região Norte, onde vive a maioria dos índios.
De setembro de 2003, quando assumiu o cargo, até agora, a Funai pagou diárias para apenas três viagens de Mércio para o Amazonas, Estado da etnia dos ticunas, a maior do País, com cerca de 26 mil índios. Neste ano, a agência de viagens emitiu apenas um bilhete para a Região Norte, mais precisamente para Marabá, no Pará. No mesmo período, foram emitidos bilhetes de passagens com escala em Londres, Genebra, Frankfurt, Paris, Bruxelas e Nova York. A viagem com escala em Berlim, Paris e Bruxelas ocorreu em março. Já a viagem com escalas em Londres, Frankfurt e Genebra, em janeiro.
Em maio, o presidente da Funai esteve em Nova York. Até para Natal, onde nasceu, há registro de bilhetes neste ano. Também foram emitidos bilhetes para cidades latino-americanas como Montevidéu, Santiago, Cidade do México, Cidade da Guatemala e Bogotá.
As viagens de Mércio foram analisadas pelo procurador junto ao TCU, Lucas Furtado, que apresentou representação ao tribunal solicitando investigação detalhada. Ainda não há conclusão do TCU.
A presença de Mércio nos badalados circuitos de encontros com organismos internacionais é motivo de críticas de líderes indígenas. Os suiás, do Xingu, planejaram uma festa na tribo só para prendê-lo, mas o plano fracassou. Mércio é acusado pelos índios de viajar para as tribos apenas em dias de festa e nunca demonstrar disposição de conversar sobre problemas. "A gente fez festa para prender ele na aldeia", relata Waduwaba Suiá, do Alto Xingu. "Não conseguimos, pois um parente morreu e depois outro. Se convidar para reunião, ele não vai. Só vai se tiver festa."
POLÊMICAS
Mércio é protagonista de decisões polêmicas. Ele já marcou sua gestão por pelo menos dois fatos: é o presidente que mais resiste no cargo desde o general Ismarth Araújo de Oliveira (1974-1979) e foi quem demitiu o sertanista Sydney Possuelo, considerado o continuador do trabalho dos irmãos Villas Bôas. Possuelo foi exonerado em janeiro do cargo de coordenador-geral de Índios Isolados após criticar declaração de Mércio de que índio tem muita terra. O sertanista disse que o presidente da Funai falava a língua dos fazendeiros.
Desde a demissão, as lideranças do Xingu, onde estão os mais influentes caciques, retiraram o apoio a Mércio.