Título: Recesso (de fato) sem LDO
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Fonte: O Estado de São Paulo, 15/07/2006, Notas e Informações, p. A3
A maneira como, driblando a Constituição na prática, o Congresso entrou em recesso mesmo sem ter votado o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)comprova, se isso ainda fosse necessário, que senadores e deputados não estão nem um pouco preocupados com o que a população e os eleitores pensam a seu respeito. ¿Foi péssimo¿, admitiu, em desabafo, o líder do PTB na Câmara, deputado José Múcio Monteiro (PE). ¿É um retrato do quadro de desmotivação e desarticulação que esta legislatura levou à Casa.¿
A Constituição determina que ¿a sessão legislativa não será interrompida sem a aprovação do projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias¿. Enviado pelo Executivo em abril, esse projeto não foi votado. Mesmo assim, os congressistas interromperam as atividades legislativas e deixaram Brasília para se dedicar à campanha eleitoral nas duas últimas semanas de julho, e talvez nas primeiras de agosto. Estão, na prática, em recesso. Mas, como nesse período haverá sessões nas quais nada será votado, formalmente não haverá recesso.
É um jeito de os parlamentares não desrespeitarem formalmente a Constituição e, ao mesmo tempo, garantirem o recebimento de seus subsídios, de quase R$ 13 mil mensais, o pagamento da verba destinada aos funcionários de seus gabinetes, de R$ quase 51 mil mensais, e a verba para os gastos em seus Estados, de R$ 15 mil.
Trata-se, entretanto, de um desrespeito ao cidadão. A exigência constitucional de se votar a LDO antes do recesso se explica pelo fato de este ser um documento essencial para a elaboração do Orçamento da União para o exercício seguinte. A LDO contém as metas e as prioridades do governo, incluindo os investimentos previstos para o ano seguinte. Como a proposta do Orçamento da União deve ser encaminhada ao Congresso até o fim de agosto, suas diretrizes, pelo menos em tese, devem ter sido aprovadas com certa antecedência.
Mas o Congresso não tem agido com a rapidez e a responsabilidade necessárias. No ano passado, só aprovou o projeto da LDO no dia 24 de agosto. Há o risco de esse prazo ser superado neste ano, o que pode gerar a esdrúxula situação de o Executivo enviar ao Congresso uma proposta orçamentária sem que tenham sido aprovadas as diretrizes para sua elaboração.
Neste caso, governo e oposição se acusam, e os dois lados têm razão. O líder do PT na Câmara, deputado Henrique Fontana (RS), disse que o processo legislativo está sendo prejudicado porque os principais partidos da oposição, PSDB e PFL, querem criar todo tipo de dificuldade para o governo. Já a oposição responsabiliza o governo pela fraca produção legislativa neste ano, alegando que o excesso de medidas provisórias assinadas pelo presidente da República atravancou o processo de votação.
No caso específico da LDO, inovações introduzidas pelo governo no projeto original tornaram particularmente difícil sua discussão. Em relação ao projeto aprovado no ano passado, o deste ano retirou o limite para os gastos públicos em porcentagem do PIB e o limite para a carga tributária. Mais ainda, deu ao governo a prerrogativa de executar o Orçamento mesmo sem aprovação do Congresso.
O relatório elaborado pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR) manteve a permissão para o Executivo realizar despesas mesmo sem a aprovação do Orçamento, na base de 1/12 por mês das despesas previstas para o ano todo, inclusive as destinadas a investimento. ¿Isso é o mesmo que mandar fechar o Congresso¿, reagiu o líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM).
É verdade. Não se pode esquecer, porém, que não é raro o Congresso deixar de aprovar o projeto da lei orçamentária em tempo hábil - como o Orçamento de 2006, que só foi aprovado no fim de abril - e, nesse caso, se não houver algum mecanismo que permita o pagamento de despesas, o governo ficará paralisado. Erros de uma parte não justificam os de outra. Sendo este um ano eleitoral em que as acusações entre governo e oposição se acentuam no decorrer da campanha, o que acontece com a tramitação da LDO pode ser o prenúncio do que acontecerá com o projeto orçamentário para 2007.