Título: Senado argentino aprova superpoderes para Kirchner
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/07/2006, Internacional, p. A14

O presidente argentino Néstor Kirchner deu ontem mais um passo em direção à obtenção dos "superpoderes" com os quais poderá alterar o orçamento do país como quiser. Uma semana depois de uma aprovação prévia, o Senado voltou a debater a polêmica lei, que aumenta as prerrogativas do poder Executivo, e aprovou-a com 37 votos a favor e apenas 6 contra.

Quinze senadores da oposicionista União Cívica Radical (UCR) abandonaram o plenário antes da votação, declarando-se ofendidos com as críticas realizadas pela primeira-dama e senadora Cristina Fernández de Kirchner, que fez uma ferrenha defesa da necessidade de ampliar os poderes do marido.

Nas horas que antecederam a votação, Kirchner desferiu uma dura campanha contra a oposição e a mídia, acusando-as de extorsão. "Não querem me deixar governar, nem que mude o país", disse exaltado. O respeitado colunistas político Joaquín Morales Solá argumenta que Kirchner - com os superpoderes - terá "terra fértil para o embrionário perfil de um governo propenso ao autoritarismo".

No total, Kirchner, por meio do chefe do gabinete de ministros, poderá modificar o destino de 40% do orçamento. Os 60% restantes são gastos fixos, como salários de funcionários públicos e aposentadorias. No ano passado, com os poderes especiais, o governo alterou 20% do orçamento.

A lei aprovada pelo Senado será votada na próxima semana pela Câmara dos Deputados (onde o governo também tem maioria, mas menor que no Senado), incluiu uma "concessão" do governo: os eventuais aumentos aos gastos secretos com serviços de inteligência (que têm uma intrincada e ampla estrutura no país) só serão definidos pelo Parlamento.

A lei tornará os superpoderes permanentes. Os poderes especiais foram usados ocasionalmente desde a volta de democracia, em 1983, apenas em graves emergências econômicas. No entanto, a crise financeira e social de 2001-2 obrigou os governos dos ex-presidentes Fernando De la Rúa e Eduardo Duhalde a usar os poderes por períodos prolongados.

A oposição argumenta que Kirchner usará esses poderes para desviar verbas com motivos eleitoreiros, para reforçar sua eventual candidatura à reeleição (ou talvez a candidatura de sua esposa, Cristina Kirchner à presidência). O senador Gerardo Morales, da UCR, afirmou que a concessão de superpoderes a Kirchner eram uma "transgressão à Constituição".

O ex-ministro da Economia, Roberto Lavagna, potencial candidato presidencial, declarou que a aprovação dos superpoderes consiste "na reafirmação de um estilo de governo que quer controlar tudo".

LAVAGEM DE DINHEIRO

Ontem Kirchner também conseguiu aprovar a lei que determina a reforma da Unidade de Investigação Financeira (UIF), organismo que investiga lavagem de dinheiro. Com a reforma, o governo controlará esse órgão, determinando a composição de sua diretoria. Desta forma, ficam excluídos os cinco investigadores independentes que existiam anteriormente. A reforma também permitirá que o Executivo tenha o poder unilateral de suspender qualquer segredo bancário no país.

Hoje, o governo tentará implementar uma modificação na lei que regula os decretos presidenciais, para tornar mais fácil sua aplicação.