Título: Sanguessuga compromete chefe da campanha de Lula no Amapá
Autor: Sônia Filgueiras
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/07/2006, Nacional, p. A4

As investigações sobre a máfia que desviava recursos da área da saúde avançam na direção do coordenador da campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Amapá, o ex-deputado José Antônio Nogueira, hoje prefeito de Santana. Ele é acusado pelo empresário Luiz Antônio Vedoin, um dos chefes do esquema dos sanguessugas, de receber dinheiro em troca da apresentação de emendas destinadas à compra de equipamentos médicos e ambulâncias.

Em depoimento à Justiça Federal, Vedoin apontou a primeira evidência de que as propinas pagas pelo esquema possam ter sido usadas para financiar campanhas eleitorais. Ele informou ter feito transferências de dinheiro para empresas e pessoas ligadas a Nogueira, para ajudar o petista na disputa pela prefeitura de Santana.

Vedoin apresentou comprovantes de transferências, um deles no valor de R$ 5 mil. O empresário - que é um dos donos da Planam, a central de todo o esquema - afirmou ainda que pagou a Nogueira em caráter de antecipação, ou seja, antes mesmo de o dinheiro das emendas ser liberado pelo Ministério da Saúde.

O acerto com Nogueira, segundo Vedoin, começou a ser negociado em 2003, quando o petista cumpria o mandato de deputado federal. O empresário disse que ficou combinado que o petista receberia 10% do valor das emendas destinadas ao esquema.

RECURSOS DIRECIONADOS

Sempre de acordo com Vedoin, Nogueira apresentou duas emendas ao Orçamento-Geral da União de 2004, no valor de R$ 240 mil, destinadas à Secretaria de Saúde do Amapá. As emendas não chegaram a ser executadas, mas Vedoin afirmou que em 2005 o petista conseguiu direcionar verbas federais para o município de Santana.

No depoimento, ficou implícito que o dono da Planam fez o pagamento adiantado justamente porque o dinheiro seria aplicado na campanha de Nogueira. Vedoin apresentou à Justiça de Mato Grosso comprovantes de depósitos em favor, entre outros, da empresa SHF Palmerense e de Ronaldo Lucas de Andrade.

O depoimento do empresário foi o resultado de um acordo de delação premiada, pelo qual criminosos contam o que sabem em troca de uma pena mais branda. Vedoin contou ter conhecido Nogueira em 2003, durante uma visita à Câmara dos Deputados, por intermédio de Pedro Braga, assessor do deputado Eduardo Seabra (PTB-AP). Braga foi preso na Operação Sanguessuga e é acusado pelo Ministério Público de participar diretamente do esquema. Serpa é um dos deputados investigados por envolvimento nas fraudes.

Procurado pelo Estado, Nogueira negou ter recebido recursos do esquema. Em nota encaminhada ao jornal, afirmou: "Gostaria de manifestar a minha mais profunda indignação, haja vista não haver procedência, visto que em dois anos de mandato exercidos (2003 e 2004) não apresentei qualquer emenda parlamentar para aquisição de ambulâncias e em meus 18 meses à frente da prefeitura de Santana, as empresas e empresários envolvidos no escândalo acima preconizado (dos sanguessugas) não forneceram qualquer produto a esta entidade."

CONTRATOS EXECUTADOS

Segundo Nogueira, as emendas que dirigiu à área de saúde foram destinadas a obras de saneamento ou à construção de postos de atendimento. Ele afirmou ainda que, ao assumir a prefeitura, encontrou seis contratos de compra de ambulâncias da Planam já executados, todos fechados pela administração anterior. Ele informou ter denunciado os contratos ao Ministério Público Federal.

Não é a primeira vez que a legalidade das campanhas de Nogueira é posta em xeque. Em 2003 deputado teve o mandato cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) por compra de votos. Ele recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Em 2004, elegeu-se prefeito e renunciou ao mandato de deputado. Como Nogueira não era mais parlamentar, o TSE extinguiu a ação.

Vedoin liga esquema ao governo O depoimento de Luiz Antônio Vedoin mostra que, no caso do PT, os contatos não se restringiam a negócios fechados nos gabinetes de parlamentares. Vedoin teria conseguido acesso a pessoas ligadas à cúpula do partido, capazes de transitar no governo. Ele afirma que desembolsou R$ 22,4 mil para cobrir despesas de hospedagem de sete pessoas, incluindo Antônio Alves, atual secretário de Gestão Estratégica do Ministério da Saúde e ex-chefe de gabinete de Humberto Costa na pasta.

Ele também diz que repassou R$ 860 mil a pessoas e empresas ligadas a José Aírton Cirilo, candidato a deputado pelo PT do Ceará e integrante do diretório nacional petista. Vedoin diz ainda ter negociado a participação em uma fatia de R$ 14 milhões enviados pelo Ministério da Saúde ao Piauí, governado por Wellington Dias (PT).

O dono da Planam relata que chegou a ter contatos na Secretaria de Saúde de Mato Grosso do Sul, Estado governado por Zeca do PT, e que repassou R$ 35 mil a Paulo Roberto, que seria genro da senadora Serys Slhessarenko (PT-MT). Conta, ainda, que negociou com o deputado João Grandão (PT-MS) o pagamento de 10% sobre emendas liberadas.