Título: 'Situação é muito complicada para nós'
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/07/2006, Economia & Negócios, p. B4

Para Marcos Jank, presidente do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), ainda há chances de a Rodada Doha ressuscitar. Jank acha que Pascal Lamy, diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), pode ser o "salvador" da rodada. Mas, se as negociações ficarem realmente suspensas por dois a três anos, o Brasil será um dos maiores perdedores.

Em primeiro lugar, porque o Brasil seria o maior vencedor da eliminação das distorções no comércio agrícola mundial, que era o principal objetivo da rodada. Além disso, com a rodada suspensa, haverá uma explosão de acordos bilaterais, acredita Jank. "Como o Brasil não fez, até agora, nenhum acordo bilateral de peso, a situação é muito complicada para nós", alerta Jank.

Por que a Rodada Doha empacou?

Havia expectativas em três áreas - a ampliação do acesso de produtos agrícolas (redução de tarifas de importação) na União Européia; a redução dos subsídios agrícolas nos Estados Unidos e a abertura do mercado industrial dos países do G-20 (e abertura agrícola da China e da Índia). Não houve grandes avanços nesses setores desde julho de 2004. Em outubro de 2005, houve um aceno de avanço por parte dos Estados Unidos e da União Européia, mas, concretamente, desde a reunião de Hong Kong não se fechava nada.

A Rodada Doha está morta?

Eu acho que a Rodada está suspensa, não morta. Ela pode renascer depois dessa crise profunda, com Pascal Lamy como o salvador. Acho que Lamy pode apresentar algum tipo de relatório em setembro, após as férias. Ele pode fazer como Dunkel (ver reportagem na página 3). Aí, os países podem, no desespero, aceitar. Senão, teremos pelo menos de dois a três anos de pausa antes que se reiniciem as negociações.

Quem é o maior prejudicado pelo fracasso da Rodada Doha?

O Brasil certamente é um dos países que mais perdem com o fracasso da Rodada Doha. A rodada existe essencialmente para corrigir as distorções na agricultura e o Brasil seria o maior beneficiário dessas correções.

O que acontece enquanto Doha está suspensa?

Haverá uma explosão de acordos bilaterais. Como o Brasil não fez, até agora, nenhum acordo bilateral de peso, a situação é muito complicada para nós. No mundo dominado por acordos bilaterais, já estamos sofrendo com o desvio de comércio e investimentos (perdendo investimentos e exportações para países que têm acordos). Na Ásia, grandes consumidores de produtos agrícolas, como a China, a Coréia e p Japão, estão correndo para fechar uma infinidade de acordos.