Título: Amorim admite acordos bilaterais
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/07/2006, Economia & Negócios, p. B4

Sem um acordo na Organização Mundial do Comércio (OMC), o chanceler Celso Amorim admite que está agora "aberto" a voltar a negociar acordos bilaterais e regionais. O ministro, porém, insiste que esses acordos não são substitutos da OMC. Para diplomatas, o fracasso em Genebra obrigará vários países a repensar suas estratégias comerciais.

Amorim diz que está na hora de pensar em uma retomada das negociações para a criação de um bloco comercial entre Mercosul e União Européia (UE). Mariann Fischer Bõel, comissária agrícola da Europa, é da mesma opinião e acha que o processo deve ser relançado antes do fim do ano.

O Itamaraty é criticado por alguns setores produtivos por não ter conseguido fechar acordos com as maiores economias nos últimos anos. As negociações entre Mercosul e UE estão virtualmente paralisadas desde 2004 e as várias tentativas de reativar o processo esbarraram nas diferenças entre os dois blocos.

"Quando estávamos a ponto de concluir a rodada da OMC, não fazia muito sentido continuar a negociação com a Europa. Agora, me sinto aberto para esse tipo de acordo", afirmou Amorim. Segundo ele, não existem problemas "conceituais" entre Mercosul e UE, apenas dificuldade em termos do grau de abertura de cada setor. "Podemos e até devemos retomar essas negociações."

Embaixador da Argentina na OMC, Alberto Dumont, diz que o Mercosul terá de repensar suas estratégias. Peter Mandelson, comissário de Comércio da Europa, afirma que ainda "é muito cedo para dizer" se o processo bilateral deve ser relançado. "Vamos digerir antes o que ocorreu aqui na OMC, pois será uma digestão difícil", disse.

Amorim aponta que poderia voltar a negociar com os Estados Unidos. Sua preferência, porém, não seria a Área de Livre Comércio das Américas (Alca), mas um acordo 5 + 1, ou seja, um entendimento entre Mercosul - Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai e Venezuela - e Estados Unidos.

"Nunca tivemos a estratégia de negar outras negociações. Mas Alca é um pouco mais complicado, pois conta com países com interesses muito diferentes. Alguns já concluíram negociações com os Estados Unidos, não têm nada a perder e estão prontos a fazer toda as concessões. Isso nos deixa numa posição difícil", explicou o chanceler, que acredita que o processo deve ser retomado "no momento oportuno".

Ontem, a representante de Comércio da Casa Branca, Susan Schwab, admitiu que os americanos buscariam acordo de todas as formas. "Queremos ser ambiciosos no âmbito multilateral, regional e bilateral."

Outra opção é a de aprofundar acordos com Índia e África do Sul. Em setembro, os três países se reúnem em Brasília e a diplomacia de Nova Délhi acredita que está na hora de um acordo de livre comércio. Um embaixador indiano, porém, ironiza as opções do Brasil diante do fracasso da OMC. "Vocês têm Hugo Chávez (presidente da Venezuela)", disse. Sobre um possível acordo com a China, Amorim é mais cauteloso. "Vamos devagar."

O chanceler deixa claro que a prioridade do Brasil sempre será a OMC. "Não há substituto para a OMC. Nenhuma dessas outras negociações pode obter aquilo que temos de obter aqui, regras equilibradas de comércio e corte de subsídios."

O México é da mesma opinião e alerta que, apesar de ter 42 acordos bilaterais assinados, não pode ficar sem a OMC. "Os acordos que temos amortecem o impacto do fracasso da OMC, mas não são a solução", disse um diplomata mexicano.