Título: Brasil ainda é campeão mundial de juros reais
Autor: Renée Pereira
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/07/2006, Economia & Negócios, p. B3

O corte de 0,5 ponto porcentual decidido ontem pelo Comitê de Política Monetária (Copom) deixou a taxa de juros básica da economia, a Selic, no menor nível já registrado em 31 anos , seundo levantamento da consultoria Austin Rating, A taxa de juros básica mais baixa foi em março de 1975: 13,6% anuais.

Este último dado é o que deverá ser usado para o governo para faturar politicamente, como já fez previamente o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Há mais de um mês, ele vem alertando para o fato de o Brasil estar prestes a ter a taxa de juros mais baixa das últimas três décadas.

Toda essa comemoração, porém, se refere à taxa nominal, que inclui a inflação. Aquela que realmente importa para as decisões econômicas, porém, é a taxa real. E esta continua sendo a maior do mundo, independente das metodologias usadas. No mercado, há dois cálculos para demonstrar o juro real (Selic menos a inflação). Um dos cálculos subtrai da taxa nominal, de 14,75% ao ano, inflação projetada para os próximos 12 meses. No outro, os economistas usam a inflação acumulada nos últimos 12 meses.

No cálculo da UP Trend, a taxa de juros real descontada a inflação projetada para os próximos 12 meses caiu para 9,9% ao ano. Já de acordo com a Austin Rating, que desconta a inflação acumulada em 12 meses, o juro real cai para 10,20%, muito elevado para os padrões mundiais. Nos dois casos o Brasil é o campeão do mundo no quesito.

De acordo com a UP Trend, o País ganha até mesmo da Turquia, que recentemente elevou a taxa nominal de juros para 17,25% ao ano. Segundo Jason Vieira, economista-chefe da empresa, isso é resultado de uma taxa nominal ainda extremamente elevada e índices de inflação reduzidos no Brasil, em torno de 3,8% ao ano. Ao contrário do que ocorre com a Turquia, cuja taxa nominal está alta, em 17,25% ao ano, mas os indicadores de preços também estão altos, acima de 8%.

A taxa nominal, por incluir a inflação, é um dado que não serve para avaliar seu real peso sobre a economia. Em fevereiro de 1990, por exemplo, foi registrada uma taxa nominal anual de 438.769,68%, o que dava uma taxa real de 11.445,27%.

Para o economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, apesar da taxa de juros real continuar alta e atrapalhar os investimentos, o fato de a Selic ter rompido a barreira de 15% ao ano deve ser comemorado. "É muito importante porque representa uma redução de custos para o consumidor e para a produção. Um grande passo foi dado", avaliou.

Para o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Carlos Thadeu Filho, mais importante que a magnitude do corte e o fato de a Selic alcançar mínimas históricas, é o fato de que a flexibilização da política de juros está ocorrendo em um período de turbulências externas e elevação das taxas básicas norte-americanas. Para ele, a dosagem do BC foi adequada para o momento. "O que ele deve ser cobrado é para que esse processo de redução gradual se prolongue por mais tempo", afirmou o professor, que espera que a taxa básica encerre o ano em 14% ao ano.