Título: Planalto prepara regras para fugir de acusação de uso da máquina
Autor: Leonencio Nossa e Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/06/2006, Nacional, p. A4

Diante das críticas de uso da máquina na campanha à reeleição, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva orientou a equipe jurídica da Casa Civil a elaborar uma portaria com regras de conduta para o Palácio do Planalto durante o processo eleitoral. A estratégia, discutida em reunião da coordenação política na manhã de ontem, é tentar mudar a imagem de um governo que estaria fazendo viagens e realizando eventos públicos só para ganhar o voto dos grotões.

Durante a reunião, ele encarregou os ministros da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, e das Relações Institucionais, Tarso Genro, de procurar hoje o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Marco Aurélio Mello, para demonstrar a disposição do governo em "colaborar" na fiscalização das eleições. Na semana passada, Marco Aurélio disse ser antiético, em ano eleitoral, os aumentos concedidos pelo governo a seis categorias de servidores.

A ordem de Lula aos ministros é buscar o diálogo com o Judiciário. Thomaz Bastos disse que o governo "não vai inventar" nada sobre a conduta do presidente na campanha eleitoral. "Já existem várias normas. Nossa idéia é consolidar tudo de maneira lógica e coordenada para que ninguém se perca num cipoal de leis nem faça trapalhadas", afirmou. O ministro observou ainda que as regras valem tanto para o presidente como para os servidores federais.

Nos últimos meses, Lula tem ironizado os que criticam suas viagens pelo País. "Um homem público não precisa de época de eleição para fazer campanha. Ele faz campanha da hora em que acorda até a hora em que dorme, 365 dias por ano", disse o presidente em discurso em Parnaíba, no Piauí, em fevereiro. Agora, a visão do Planalto é de que não dá para fazer ironias e brincadeiras.

Questionado sobre as posições rígidas tomadas recentemente pelo presidente do TSE, Tarso foi diplomático. "O diálogo não é para fazer com que ele mude de idéia, mas, sim, para mostrar que temos respeito por suas decisões e, quando não concordarmos com elas, as instâncias do Judiciário vão resolver. A posição do governo não pode ser tomada como desacato à sua autoridade nem como crítica à sua visão", argumentou.

Candidato, Lula não pode mais participar de inaugurações e eventos da administração pública que possam ser considerados como propaganda. A orientação jurídica do Planalto é para que ele substitua inaugurações por viagens de "inspeção" de obras.

Especialistas em direito eleitoral, no entanto, avaliam que isso pode ser interpretado como abuso de poder político. Em situações desse tipo a Justiça Eleitoral pode abrir uma investigação. Se encontrar provas de que houve alguma burla à legislação, o político estará sujeito a penas como cassação do registro da candidatura e até mesmo inelegibilidade.

No caso do presidente, a Lei Eleitoral proíbe atos de campanha nos prédios da administração federal, como os Palácios da Alvorada e do Planalto. E a estrutura da Presidência não pode ser usada em benefício do candidato.

Efeitos da preocupação de Lula com as críticas ao uso da máquina já podem ser percebidos no dia-a-dia da Presidência. Ontem, a Radiobrás não divulgou o programa de rádio Café com o Presidente, usado por Lula para informar às camadas mais pobres da população sobre ações do governo.