Título: A prosperidade perdida de um país
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/06/2006, Internacional, p. A16

Por que a economia não cresce mais depressa, criando mais empregos e elevando os padrões de vida? Essa é a pergunta com a qual inevitavelmente se confrontará o vencedor da eleição presidencial mexicana no domingo, mas é também uma questão crucial para os americanos. Um país mais próspero não estaria mandando tantos cidadãos mais pobres para o norte. Desde 1990, de 20% a 25% dos imigrantes nos EUA têm vindo do México.

Eis uma comparação esclarecedora. Em 1970, a renda média da Coréia do Sul era cerca da metade da do México. Em 2004, a renda dos coreanos era mais que o dobro da dos mexicanos. Durante essas décadas, segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a renda média dos mexicanos subiu 57%, para US$ 9.178 (expressa no valor do dólar no ano 2000), enquanto o aumento de renda coreana foi de 574%, chegando a US$ 19.148.

Não é que o México não tenha progredido. Sua economia antes era propensa a crises, oprimida pela inflação e muito isolada do comércio exterior. Agora o país domou a inflação (para cerca de 4%, enquanto no final da década de 1990 era de 17%), controlou os gastos do governo e se abriu para o comércio. Antes da adoção do Nafta (North America Free Trade Agreement - Tratado de Livre Comércio da América do Norte), em 1994, as tarifas sobre importações protegidas eram em média 12% (e muito mais altas na década de 1980). Já em 2001 foram de 2%. A última crise financeira - o colapso da moeda, um escoamento de dinheiro para o exterior - ocorreu em 1994 e 1995. Nos últimos anos, a economia mexicana tem crescido quase 4% anualmente.

Porém, tal índice de crescimento, bom para um país avançado como os Estados Unidos, não é suficiente para um país pobre cuja população está aumentando 1% ao ano, como é o caso do México. Na China, o crescimento econômico está numa média de 9% a 10% ao ano e na Índia, de 6% a 8%. O México não pertence à mesma liga.

As economias avançam adotando melhores tecnologias e métodos empresariais. A produção e a eficiência aumentam. Os preços caem ou os rendimentos aumentam. De qualquer uma das formas, as pessoas podem comprar mais - mais coisas tradicionais (digamos, alimentos ou moradias) ou mais coisas novas (digamos, conexões de internet e iPods). No México, esse processo é fraco. Para simplificar - sua economia consiste de dois vastos setores, ambos lentos em adotar melhor tecnologia e melhores práticas empresariais.

Um dos setores envolve firmas grandes e modernas em mercados semiprotegidos que restringem a pressão para aumentar a eficiência ou baixar os preços. "O setor empresarial do México é avesso ao risco. Nunca teve que operar num ambiente de verdadeira competitividade", diz Pamela Starr, analista do Eurasia Group, uma firma de consultoria. "Tem operado com monopólios e oligopólios incentivados pelos governo".

Um caso extremo é a Pemex, o monopólio de petróleo de propriedade estatal. Sem concorrentes e sem acionistas que reclamem, suas operações são negligentes, descuidadas. Em 2004, a Pemex teve vendas de US$ 69 bilhões com 137.722 funcionários, segundo seu site na Web. No mesmo ano, a Exxon Mobil vendeu US$ 291 bilhões com 85.900 funcionários. A Telmex, que domina o mercado de telefonia, é freqüentemente citada como outro exemplo. Em 2004, o México tinha a sexta taxa de telefone mais alta para o consumidor médio entre os 29 países membros da OCDE.

A outra parte da economia é geralmente chamada de setor informal. E consiste em milhares de pequenas firmas, camelôs, lojas, lojas de consertos, fabricantes minúsculos - que teoricamente não são legais, porque não têm registro no governo e muitas vezes não pagam impostos nem cumprem as normas referentes a pagamento de salários, contratação e demissão de funcionários. Quase dois terços dos trabalhadores mexicanos estão empregados no setor informal, segundo estimativa do Fundo Monetário Internacional (FMI).

O tamanho do setor sugere uma grande vitalidade empresarial. O problema é que essas firmas são virtualmente compelidas a permanecer pequenas e ineficientes. Como tecnicamente são ilegais, não é fácil para elas obter empréstimos bancários e não podem crescer muito sem serem obrigadas a pagar impostos e cumprir as normas governamentais. No México, empresas com menos de dez funcionários respondem por quase dois quintos dos empregos. Nos EUA, tais firmas representam apenas a nona parte do total de empregos.

Isso tudo frustra o crescimento econômico acelerado - embora os obstáculos tenham diminuído quando o México se abriu para o mercado e investimentos externos. A questão mais difícil é saber o que criou este sistema. Lawrence Harrison, especialista em desenvolvimento econômico da Tufts University, culpa a cultura. Os valores latino-americanos, diz ele, têm resistido a mudanças e incentivado o rent-seeking (processo pelo qual um indivíduo ou firma busca ganhos por meio da manipulação do ambiente econômico em vez de por meio do comércio e da produção de riqueza agregada) por parte das elites empresariais - competindo pelos favores do governo que proporcionam mercados protegidos. As sociedades asiáticas, argumenta ele, têm aceitado mais a mudança e atingiram índices de poupança mais altos, que conduzem a um crescimento econômico mais rápido.

O economista William Easterly, da New York University, é cético em relação à explicação cultural e diz que tirar a ênfase do protecionismo comercial e da intervenção do governo requer tempo. "Defensores do livre comércio e do livre mercado exageram nas promessas do que pode ser realizado a curto prazo", diz ele. Atitudes e instituições costumam mudar lentamente. "A recompensa vem a longo prazo", argumenta.

No papel, os principais candidatos à presidência defendem diferentes políticas econômicas. O ex-prefeito da Cidade do México, Andrés Manual López Obrador, do centro-esquerdista Partido da Revolução Democrática, insiste em mais ativismo por parte do governo. Já Felipe Calderón do Partido de Ação Nacional, de centro-direita - o partido do atual ocupante da presidência, Vicente Fox - é a favor "do mercado".

Ambos, porém, deverãoter problemas em sancionar sua pauta sem maioria no Poder Legislativo, com o antes dominante Partido Revolucionário Institucional (PRI) controlando os votos dos indecisos. Na melhor das hipóteses, o crescimento econômico pode melhorar ligeiramente e na pior, talvez decresça. Para os americanos, as implicações são sérias. Há muito tempo que o México considera a imigração uma válvula de segurança econômica. Ganhe quem ganhar as eleições, isso não mudará.

*Robert J. Samuelson é colunista do 'Washington Post'