Título: 'Crise fiscal é ameaça já para 2007'
Autor: Marcelo Rehder
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/08/2006, Economia & Negócios, p. B4

O País mergulhará numa crise fiscal já no próximo ano por causa do aumento excessivo dos gastos públicos. O alerta foi feito ontem por especialistas em contas públicas, como o economista Raul Velloso e o consultor econômico do Senado, Marcos Mendes, em seminário realizado em São Paulo pelo Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial.

"Se nada for feito, haverá uma crise de confiança na capacidade de o País administrar sua dívida, o que poderá levar à fuga de capitais, alta do câmbio, aumento dos juros, redução do crescimento e, conseqüentemente, à recessão", adverte Velloso.

Na avaliação do economista, o próximo governo, seja ele qual for, só terá uma chance de tomar as medidas necessárias para evitar essa crise. "Será logo depois que tomar posse, quando terá cacife político para adotar medidas impopulares".

Segundo ele, a situação é mais dramática porque até a eleição nenhum candidato falará dessa questão. "Só que o eleito vai ter que trabalhar freneticamente porque vai ter um ou dois meses para tomar as medidas necessárias, caso contrário, ficará para outro governo".

Para Velloso, o modelo de geração de superávit primário (resultado de receitas menos gastos, sem considerar despesas financeiras) via aumento de arrecadação e corte de investimentos está esgotado. Ele argumenta que a carga tributária já bateu no seu limite máximo suportável pela sociedade e os investimentos públicos chegaram ao fundo do poço.

"A capacidade de gerar superávits primários elevados se esgotou antes que os juros reais (descontada a inflação) chegassem a um nível seguro de 5% a 7% ao ano, o que levaria o País a ingressar num círculo virtuoso, abrindo espaço para a convivência com um superávit menor mais à frente", observou.

De acordo com Velloso, a administração federal é uma máquina programada para ampliar os gastos correntes da União. "Enquanto esses gastos estiverem crescendo, só há duas maneiras de resolver o problema fiscal: aumentar as receitas ou cortar investimentos. Só que estamos fazendo isso desde 1999 e chegou num ponto em que isso não é mais possível porque a sociedade não está disposta a pagar mais impostos nem há mais onde cortar investimentos".

O consultor econômico do Senado, Marcos Mendes, também alertou para o risco de uma crise fiscal a partir do próximo ano. O tamanho do Estado, segundo ele, precisa ser reduzido, ao mesmo tempo em que o governo ganhe eficiência no gasto público. "O desafio para o próximo governo será enfrentar a questão fiscal e reconhecer que é um problema. Se não fizer isso, estaremos condenados a continuar a ter taxas de crescimento medíocres".

Para o consultor, é preciso ir além do superávit primário para se conseguir o ajuste fiscal. "Estamos gerando superávits primário desde 1999 e esse processo já está próximo da exaustão. Temos que melhorar a qualidade do ajuste fiscal e é melhor fazer isso enquanto ainda não estamos no meio de uma crise", disse.