Título: Reforma das licitações
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/08/2006, Notas e Informações, p. A3
O governo poderá economizar tempo e dinheiro com a reforma do sistema de licitações públicas. Mais concorrência, menor número de contestações judiciais e maior proteção contra a má-fé são os objetivos principais do projeto, segundo informa o Ministério do Planejamento. Os governos estaduais estão sendo consultados e a proposta será enviada ao Congresso provavelmente depois das eleições de outubro.
É pouco provável, portanto, a aprovação da mudança neste ano. Depois das eleições, os parlamentares terão de correr, se quiserem concluir a apreciação da proposta orçamentária antes do recesso do fim de ano. Além disso, será necessária, provavelmente, uma limpeza da pauta, sempre sobrecarregada de medidas provisórias. Enfim, parlamentares não reeleitos dificilmente dedicarão os últimos dois meses de mandato à discussão de novos projetos de lei.
A tramitação dependerá, portanto, do empenho do governo eleito em outubro e de sua articulação com a base parlamentar. Se tudo correr da melhor maneira, o setor público poderá dispor, dentro de um ano ou pouco mais, de mais um instrumento para aperfeiçoar a administração e tornar mais eficiente o uso dos impostos arrecadados.
A idéia básica é melhorar tanto a Lei de Licitações de 1993 quanto as normas do pregão de compras de bens e serviços. Pelo projeto em estudo, os concorrentes poderão apresentar suas propostas em mais de uma rodada, mesmo no caso de grandes licitações. Hoje, o assunto se encerra depois da abertura dos envelopes, exceto no caso dos pregões de compras de valor limitado. Com isso, o governo terá uma possibilidade maior de realizar um bom negócio para os contribuintes.
Com a nova legislação, o governo deverá dispor de meios mais eficazes para afastar os empresários inidôneos. Pelo sistema atual, há pouca defesa contra empresas que vencem as concorrências, apresentando preços muito baixos, e depois abandonam os serviços ou obras quando perdem o interesse. A punição pelo descumprimento do contrato deverá ser agravada. A inabilitação para concorrências públicas poderá passar de dois para dez anos, com extensão da pena às pessoas físicas dos empresários.
Também se tentará reduzir o número de recursos judiciais, que hoje emperram as licitações e atrasam a execução das obras ou o início da prestação de serviços. Recursos são permitidos na habilitação, na apresentação de propostas técnicas e na concorrência de preços. As fórmulas em estudo deverão permitir recursos apenas depois do último passo.
As licitações para compras de bens e serviços têm sido, tradicionalmente, procedimentos altamente vulneráveis a fraudes, a combinações desonestas e a outras formas de lesão do interesse público.
As defesas do setor público tornaram-se mais eficientes desde os anos 90, com a introdução de vários aperfeiçoamentos no processo. A adoção de pregões eletrônicos para compras de valor limitado, primeiro em alguns Estados, depois na administração federal, foi uma das inovações mais importantes. Ela permitiu a economia de bilhões de reais em poucos anos, pela criação de condições mais favoráveis à concorrência e pela maior exposição pública.
Apesar dos aperfeiçoamentos, a administração ainda é vulnerável a várias formas de estratégias contrárias ao interesse público. Sempre há espaço, portanto, para a melhora das leis e de outras formas de regulamentação das compras de bens e serviços pelos governos, em todos os níveis.
Boas leis de concorrência e regulamentos bem-feitos não bastam, naturalmente, para resolver o problema. O escândalo dos sanguessugas é uma prova disso. Depois do caso dos "anões do orçamento", nos anos 90, os otimistas imaginaram que fraudes semelhantes não voltassem a ocorrer. Estavam errados.
Ao lado de boas leis e de regulamentos bem-feitos é indispensável o permanente controle político do funcionamento dos órgãos públicos, incluído o Congresso. Se os eleitores se lembrarem disso, o Congresso que discutirá e votará a reforma da Lei de Licitações será melhor que o atual.