Título: Empresas estrangeiras investem no Brasil para fornecer à Embraer
Autor: Mariana Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 31/07/2006, Negócios, p. B14

A exigência do governo federal para que a Embraer nacionalize a maior parte de sua produção começa a surtir efeito. Trens de pouso, asa, interiores e parte da fuselagem já começam a ser fabricados no Brasil. O volume dos componentes produzidos no Brasil ainda é pequeno, mas vem crescendo. Representa quase 40% das aeronaves, cerca de 10 pontos porcentuais a mais do que há dois anos.

O processo já começa a surtir efeitos na "balança comercial" da Embraer. A diferença entre as exportações e importações cresceu12,8% em 2005, na comparação com o ano anterior, alcançando o saldo de US$ 1,5 bilhão. No ano passado, a fabricante exportou US$ 3,2 bilhões e importou US$ 1,7 bilhão. É a 3ª maior empresa exportadora do País - atrás da Petrobrás e da Vale do Rio Doce - e também a 3ª maior importadora.

EMPREGOS

Nos últimos anos, mais de meia dúzia de grandes fornecedores estrangeiros da fabricante inauguraram fábricas e transferiram para o Brasil parte da produção de componentes para os aviões da Embraer. Segundo cálculos da empresa, mais de 2 mil empregos foram criados no País com o processo de nacionalização da produção.

Os benefícios para a economia não param por aí. Alguns fornecedores, como a alemã Liebherr - que fabrica no Brasil o trem de pouso a partir de uma joint venture com a própria Embraer, chamada Eleb -, já começam a fazer investimentos descolados da fabricante brasileira.

A empresa inaugurou em março, em Guaratinguetá, uma fábrica de peças de precisão para sistemas hidráulicos de aviões que abastece a matriz na Alemanha. "Excluindo as vendas da Embraer, o setor aeronáutico brasileiro ainda exporta muito pouco, mas o movimento está começando", afirma o presidente da Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (Aiab), Walter Bartels.

PEQUENAS EMPRESAS

Além dos fabricantes estrangeiros e da Embraer, o setor aeroespacial brasileiro é formado por cerca de 70 pequenas e médias empresas, boa parte formada por engenheiros que deixaram a Embraer na privatização. Elas se dividem entre fabricantes de pequenas peças e prestadores de serviços.

Há quatro anos, 11 dessas empresas formaram o consórcio High Technology Aeronautics (HTA) para conquistar mercados no exterior. Para isso, contam com o apoio da Agência de Promoção de Exportações (Apex). Hoje a HTA fornece partes de turbinas da canadense Pratt & Whitney e partes estruturais para aeronaves militares da Eads/Casa.

NACIONALIZAÇÃO

O processo de nacionalização da produção da Embraer começou em 1999, por uma exigência do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que desde 1995 financia as vendas da companhia com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Até o momento, a soma dos financiamento passa da casa de US$ 6 bilhões, segundo o banco.

Em 2000, a Goodyear - que produz pneus automotivos no Brasil desde 1939 e é fornecedora da Embraer desde 1969 - substituiu a importação dos pneu de avião e passou a produzi-los em sua fábrica no bairro do Belenzinho, em São Paulo.

CUSTOS

Além de melhorar a balança comercial e gerar empregos, a produção local dá mais flexibilidade à Embraer e ajuda a reduzir custos. Com uma fábrica em Jacareí inaugurada em fevereiro, a francesa Latecoere está trazendo progressivamente para o Brasil a montagem final da fuselagem dos aviões da família 170/190. A matéria-prima, alumínio aeronáutico, continuará a ser importada, pois não é fabricada no Brasil. "A montagem no Brasil permite alterar a configuração rapidamente para se adaptar a uma mudança no pedido de um cliente", diz o gerente administrativo-financeiro da Latecoere, Cláudio Souza. A empresa tem 150 funcionários, número que deve dobrar até o final de 2007. Para formar essa mão-de-obra, a empresa planeja criar um centro de treinamento, em parceria com o Senai.

A montagem da fuselagem é apenas uma parte do que a Latecoere produz para a Embraer, seu segundo principal cliente, atrás apenas da Airbus. As portas dos aviões continuarão a ser importadas da França, diz o vice-presidente de comunicação do grupo, Jean Pierre Robert.

A própria Embraer tem absorvido algum conteúdo de produção que antes era fabricado por estrangeiros. A japonesa Kawasaki nacionalizou a montagem a asa dos jatos 190/195 com a inauguração de uma fábrica em Gavião Peixoto em 2003. Há dois meses, a empresa anunciou sua saída do País, mas a produção da asa foi absorvida pela Embraer.

Assim como as portas, partes importantes como turbinas dificilmente serão produzidas no Brasil por falta de escala. Dentre as áreas com potencial de atrair investimentos estão equipamentos eletrônicos, software aeronáutico e materiais à base de fibra de carbono. "É importante criarmos financiamento para outras partes da cadeia aeronáutica", afirma o assessor da presidência do BNDES, Sérgio Varella Gomes. Juntamente com a Aiab, a Embraer e a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), o BNDES estuda a criação de um programa de fomento para o setor.