Título: UE só corta subsídios após 2013
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/08/2006, Economia, p. B9

Uma nova reforma do sistema protecionista agrícola europeu somente ocorreria a partir de 2013. O aviso é da comissária de Agricultura da União Européia (UE), Mariann Fischer Boel. Em um discurso feito ontem para fazendeiros na Finlândia, ela voltou a criticar o comportamento dos Estados Unidos e até do Brasil na Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) e apontou a estratégia para que o setor agrícola sobreviva no velho continente: a exportação de produtos de alta qualidade e a reconversão da produção agrícola em etanol.

Durante as negociações comerciais em Genebra, a Europa foi acusada de não aceitar uma maior liberalização de seu mercado para produtos agrícolas de países emergentes, como Brasil e Argentina. Bruxelas argumenta que, para promover cortes mais profundos em suas barreiras, precisaria de uma nova reforma da Política Agrícola Comum (PAC), um dos pontos mais delicados da agenda diplomática européia.

Para Mariann, o fracasso da rodada é negativo para os interesses dos europeus, já que o processo seria o único que conseguiria forçar os Estados Unidos a cortar subsídios. "Acordos bilaterais não vão conseguir parar os subsídios americanos", alertou.

A comissária destacou as mensagens de otimismo em relação ao futuro das negociações do chanceler Celso Amorim e da representante de Comércio da Casa Branca, Susan Schwab, após o encontro entre os dois, no Brasil, no fim de semana. "Quero ver onde está o conteúdo nisso antes de tomar novos passos. Para ser sincera, não espero ver muitas oportunidades no futuro próximo."

REFORMA O sistema de subsídios ao setor na Europa data dos anos 60 e chegou a consumir mais da metade do orçamento da Comissão Européia. Hoje, com 4% da população no campo, países como a Inglaterra defendem uma revisão nos subsídios, feita pela última vez em 2003. Mas países como França e Dinamarca já deixaram claro que se opõe a mudanças.

Ainda neste ano, a comissária espera completar a reforma de 2003 com corte de subsídios para o setores de vinhos, frutas e legumes, áreas que até hoje se mantiveram intactas. Mas, para setores como os do açúcar, leite e carnes, as alterações feitas em 2003 devem ser as únicas da década.

Para 2008, Bruxelas planeja uma avaliação das reformas. Mas Mariann afirma que não estão previstas novas aberturas de mercado. "Mudanças significativas (na agricultura) só após 2013", afirmou.

A comissária admite que os europeus enfrentarão uma concorrência cada vez maior e, por isso, a sobrevivência do setor agrícola depende de três fatores. O primeiro é a especialização em produtos de maior qualidade. O segundo, o envolvimento dos agricultores na produção de biomassa. O que permitiria que os fazendeiros continuassem no campo, mas sem produzir alimentos. "Com o preço do petróleo a US$ 75 por barril, existem possibilidades para a produção de bioetanol e biodiesel."

Para completar, a comissária defende que as comunidades rurais diversifiquem as atividades, fortalecendo, por exemplo, o turismo.

Mariann e o representante de Comércio da União Européia, Peter Mandelson, recusaram, ontem, o convite do ministro de Comércio australiano, Mark Vailer, para participar de uma reunião marcada para setembro, na Austrália, para tentar retomar as negociações da Rodada Doha.