Título: Ricos podem ganhar mais poder com reforma no FMI
Autor: Rolf Kuntz
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/09/2006, Economia, p. B6
O Brasil tentará evitar que as economias mais fortes ganhem mais poder em conseqüência da redistribuição de cotas e de votos no Fundo Monetário Internacional (FMI). A mudança poderá produzir esse efeito paradoxal, aumentando a influência dos Estados Unidos, da Alemanha e do Japão, dependendo da fórmula que for sacramentada. Impedir esse resultado será politicamente complicado porque a maioria dos pobres tenderá a seguir o voto dos mais poderosos.
O perigo, do ponto de vista brasileiro, é que o novo critério beneficie os países muito pobres, alguns emergentes, como China e México, e enfraqueça politicamente o Brasil e outros países de renda média.
¿Somos favoráveis ao aumento de participação de alguns emergentes, mas contrários a que isso se dê às expensas de outros emergentes¿, disse ontem o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, resumindo a posição dos técnicos brasileiros envolvidos no debate.
A preocupação com o desequilíbrio foi indicada, na terça-feira, no comunicado conjunto dos chefes de governo do Brasil, da Índia e da África do Sul, depois de uma reunião em Brasília. A referência aparece no parágrafo 32: ¿A reforma deve efetivamente reduzir o grave desequilíbrio entre a ampla maioria de poder de voto detida pelas economias avançadas e a participação insatisfatória dos países em desenvolvimento¿.
É praticamente certa a aprovação política, em nível ministerial, da proposta de redistribuição discutida no começo do mês pela diretoria executiva. A resolução apresentada pelo diretor-gerente, Rodrigo de Rato, foi aceita pela maioria dos diretores, com oposição de Brasil, Argentina, Índia e Egito.
Mas ainda há espaço para briga na segunda fase da mudança, embora o êxito seja improvável. Na primeira etapa, China, Coréia, México e Turquia vão ganhar mais cotas e votos, pelo critério atual. Na segunda, toda a distribuição será revista com base em nova fórmula.
Será preciso atacar três pontos para evitar que Brasil e outros países de renda média sejam os grandes perdedores. Em primeiro lugar, será necessário cuidar dos detalhes da própria fórmula para garantir uma efetiva redistribuição. Reforçar a legitimidade do Fundo é uma das justificativas para a nova divisão de cotas e votos.
Em segundo lugar, é preciso definir se as maiores economias, beneficiárias potencias da nova fórmula, estão dispostas a renunciar a uma concentração maior de poder. A fórmula definitiva ainda será aprovada, mas já sabe que os novos critérios deverão dar grande peso não só ao tamanho de cada economia, mas também à sua abertura, medida pelas transações correntes do balanço de pagamentos.
Por enquanto, só os americanos se manifestaram, e sem nenhum compromisso, a respeito do assunto. Se os Estados Unidos mantiverem a participação atual, de cerca de 17%, já terão poder de veto em todas as questões mais importantes, que dependem de 85% de votos para aprovação.
Contentar-se com essa fatia será a atitude mais cômoda para o governo americano. Para aumentar a participação no capital do FMI, o Executivo teria de pedir autorização ao Congresso, onde as instituições multilaterais são vistas com pouca simpatia.O caso do Japão é diferente porque haverá interesse em evitar que o país seja ultrapassado pela China.
Em terceiro lugar, será indispensável esclarecer quem será favorecido pela redistribuição das cotas básicas, que são independentes da participação no capital. Se os acréscimos forem apenas para os muito pobres, o resultado será irrelevante.